Título: Desconcentração bancária reduziria juros
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Fonte: O Globo, 04/05/2012, Opinião, p. 6

Ogoverno está em franca ofensiva para tentar reduzir as taxas de juros de mercado no Brasil. A presidente Dilma Rousseff aproveitou sua mensagem do Dia do Trabalho para tocar novamente nesse tema, enfatizando que não via razão para as taxas de juros serem ainda tão altas. Em favor dessa ofensiva colabora o ambiente internacional de folgada liquidez, o que tem sido motivo de crítica por parte do governo brasileiro, devido à desvalorização que vem causando às moedas de economias mais desenvolvidas, em prejuízo das emergentes, que não tiveram seu processo de crescimento interrompido.

Juros mais compatíveis com os padrões do resto do mundo é uma das aspirações do sistema produtivo e dos consumidores desde o lançamento do real, mas há que se reconhecer que persistem na economia brasileira obstáculos para o alcance de tal objetivo. O principal deles é a própria inflação. O esforço para derrubar a inflação crônica e aguda exigiu um longo período de restrição ao crédito. Em termos relativos, a economia brasileira registra um dos mais baixos volumes de crédito (cerca de 50% do Produto Interno Bruto) entre as maiores do planeta. Mas, nos últimos anos, o crédito tem se expandido a um ritmo acima de 15% - superando 20%, em alguns períodos de 12 meses. Em determinados segmentos, como o de financiamento a habitações, a velocidade de crescimento passou de 60%, dobrando sua fatia no conjunto do crédito, embora ainda não represente mais que 4% do PIB.

O crédito já não sofre a mesma competição do endividamento público, que antes absorvia a oferta dos recursos administrados pelo sistema financeiro (e era um fator de grande pressão sobre as taxas de juros). Isso permitiu que o crédito se expandisse ao elevado ritmo mencionado.

As instituições financeiras brasileiras não têm no momento dificuldades para captar recursos. Assim, o custo de captação tem diminuído - até pelos cortes na Selic (taxa básica de juros) -, e era de se esperar que esse fenômeno se refletisse nos juros dos empréstimos, o que não ocorreu, reforçando as críticas aos excessivos spreads bancários no país.

Essa inércia pode ser quebrada por iniciativas em várias frentes, entre as quais a redução do risco do crédito (pois a inadimplência é apontada como uma das principais causas dos altos spreads). A carga tributária também deve ser considerada. Mas é preciso também estimular a concorrência no seio do sistema bancário, mas não só pela ação dos bancos públicos, pois nesse caso não haverá modificação no quadro de concentração do sistema financeiro, transferindo-se apenas alguma fatia de mercado de uma instituição para outra. Na ofensiva para reduzir os spreads, o governo deve ter uma política que favoreça a desconcentração - hoje, os dez maiores grupos financeiros, de um total de 120 bancos, detêm aproximadamente 80% do mercado. Se a oferta de crédito se disseminar por um maior número de instituições, a concorrência se encarregará de derrubar as taxas dos empréstimos. Por causa da concentração bancária, a "mobilidade" dos clientes é pequena. Poucos mudam de bancos atraídos por oferta de crédito a custos mais baixos, porque as diferenças de taxas não têm sido significativas. Uma política de desconcentração bancária é um adequado dever de casa para o Planalto. Só discurso não adianta.