Título: Baixar juros tem barreiras além da poupança
Autor: Valente, Gabriela; Beck., Martha
Fonte: O Globo, 06/05/2012, Economia, p. 41

BRASÍLIA. A principal barreira para o Brasil ter juros de primeiro mundo, como quer a presidente Dilma Rousseff, caiu com a mudança na correção da poupança, mas o país tem outros problemas que impedem o Banco Central (BC) de derrubar ainda mais a taxa básica (Selic). Entre eles, estão os subsídios ao crédito - dados pelo próprio governo e condenados pela autoridade monetária - e a indexação da economia brasileira. Economistas ouvidos pelo GLOBO concordam que a correção dos preços pela inflação passada realimenta o dragão e dificulta o trabalho do Comitê de Política Monetária (Copom) no controle dos preços.

- Hoje, energia elétrica, ônibus, educação, por exemplo, aumentam automaticamente e colocam mais combustível na inflação - diz o professor da Unicamp Francisco Lopreato.

Na cruzada contra a indexação, a próxima batalha para eliminar as fórmulas fixas de remuneração deverá ser a dos contratos das dívidas de estados e municípios. Hoje, a correção é feita pelo IGP-DI mais um percentual fixo que varia entre 6% e 9% ao ano, o que significa um custo financeiro muito alto para os governos regionais. No entanto, para fazer qualquer mudança nessa regra será preciso alterar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), considerada um marco na recuperação das finanças do setor público.

- O ideal é acabar com a indexação, mas não precisa disso para reduzir os juros - opina o economista Amir Kahir.

Ele acredita que há espaço para o governo fazer as mudança institucionais necessárias, enquanto o BC corta ainda mais a taxa básica. Kahir destaca que com a queda da Selic o governo paga menos juros no financiamento da dívida pública:

- A sobra de caixa poderia dar mais estímulos à economia, como reduzir impostos para mais setores, como fez para a indústria.

Subsídio ao crédito é outro entrave à queda dos juros

Outro obstáculo para a queda dos juros é o subsídio ao crédito. O BNDES inunda a economia com recursos mais baratos do que os de mercado, o que prejudica a ação do BC no controle da inflação.

Há um ano, a autoridade monetária faz alertas em seus documentos sobre os danos que o excesso de subsídios causa à política monetária, mas fala ao vento. O apelo é solenemente ignorado pela equipe econômica que não tomará providências.

A crítica é que esses financiamentos mais baratos não respondem aos estímulos da política monetária, quando a taxa de juros é usada para conter o crédito e controlar a inflação.

- Estamos vivendo uma fase intermediária: ainda não dá para tirar os benefícios, mas é o momento de repensar vários posicionamentos do país - opina o ex-diretor do BC Carlos Thadeu de Freitas.

Do outro lado da briga, está o Ministério da Fazenda. A equipe econômica conta com o banco para impulsionar o crescimento mesmo com a consciência de que há um impacto na inflação quando a instituição abre seus cofres. O argumento é que, no futuro, esses desembolsos aumentam a capacidade produtiva do país e, com mais oferta no mercado, a inflação cai. Com juros menores, o governo garante que as empresas tenham um custo financeiro parecido com as suas concorrentes estrangeiras.

Para o ex-integrante do Copom Luiz Fernando Figueiredo, a necessidade de cortar os juros por causa dos efeitos da crise internacional que se agrava lá fora será maior que qualquer empecilho. Ele aposta que a Selic ficará abaixo de 8% ao ano por causa dos fracos sinais que a economia mundial tem dado:

- Tem, sim, espaço para a queda dos juros no Brasil. A gente precisa de mais estímulo na economia.