Título: Corte de juros nas mãos do governo
Autor:
Fonte: O Globo, 01/05/2012, Opinião, p. 6

Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o Banco Central acenou com a possibilidade de mais redução na taxa básica de juros, atualmente de 9%, a segunda mais baixa desde o lançamento do real. É uma aspiração de todos os agentes econômicos que as taxas de juros no Brasil se nivelem a padrões internacionais, o que depende do comportamento da inflação. Mas, de fato, hoje já não é mais tão grande a distância que separa os juros básicos brasileiros da média de economias emergentes.

Os juros são uma espécie de amortecedor da demanda por bens e serviços. Quando baixam, tornam o crédito mais atrativo, estimulando consumo e investimentos. Se a oferta na economia, por diversos fatores (escassez de mão de obra, suprimentos, infraestrutura etc.), não consegue acompanhar a mesma velocidade da demanda, o resultado pode ser um desequilíbrio comprometedor no mercado, que jogue os preços para cima ou torne o país muito dependente de importações.

Como a demanda é historicamente reprimida em diversos segmentos, a economia brasileira precisa de tempo para se ajustar. E é com essa justificativa que o governo mantém um regime de metas de inflação com alvos ligeiramente superiores à variação observada nos preços das economias mais importantes no mundo.

Na prática, existe um conflito entre mais ou menos crescimento econômico e os desequilíbrios causados por esse ritmo de atividade. Juros mais baixos podem funcionar como alavanca ao crédito, acelerando a demanda, o que, por sua vez, tende a pôr em risco as metas de inflação. Na visão do Banco Central, descrita na ata da reunião do Copom, o mundo passa por um momento em que não há pressões inflacionárias vindas de fora (ao contrário, os preços no exterior, na média, vêm caindo). A expansão da economia brasileira como um todo também estaria aquém do satisfatório. Desse modo, para o Banco Central, haveria espaço para corte futuro nos juros, aproximando mais as taxas brasileiras dos padrões internacionais. Como as opiniões são divergentes em relação à eficácia dessa iniciativa, com o passar do tempo saberemos, na prática, quem está com a razão.

Há alguns indicadores macroeconômicos que sopram a favor da decisão do Banco Central. O endividamento líquido do setor público diminuiu relativamente, e, pelas projeções do BC, deve ter fechado o mês de abril no mais baixo patamar da história do real (cerca de 36% do Produto Interno Bruto). Se for confirmada a tendência de redução do déficit nominal para algo como 1,2% do PIB no segundo semestre - atualmente este índice é da ordem de 2,5% -, uma fonte importante de pressão sobre a demanda e as próprias taxas de juros terá seu efeito atenuado.

Pode-se assim dizer que o êxito da política de corte nas taxas de juros está fundamentalmente nas mãos do governo. Cabe a ele também zelar pela própria qualidade do ajuste. Deveria, portanto, deixar de lançar mão de "contabilidade criativa" para apresentar dados mais robustos de superávit, assim como equilibrar as finanças oficiais menos pelo lado das receitas do que via despesas.