Título: Analistas temem que BC ceda a pressões políticas
Autor: Beck, Martha; Valente,Gabriela
Fonte: O Globo, 10/05/2012, Economia, p. 31

BRASÍLIA. A pressão do Palácio do Planalto pela queda dos juros num momento em que a inflação está em alta e a sinalização do Banco Central (BC) de que voltará a reduzir a Taxa Selic já na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) colocaram em xeque a autonomia da autoridade monetária. Analistas do mercado temem que o BC esteja cedendo a pressões políticas e abandonando, na prática, o regime de metas de inflação em nome do crescimento econômico de curto prazo desejado pela presidente Dilma Rousseff, criando, com isso, um quadro de desequilíbrio para o futuro.

Para melhorar a imagem da instituição, parte do mercado defende que a divulgação do voto dos diretores do BC na reunião do Copom, com o argumento de dar mais transparência à decisão sobre os juros e, assim, reafirmar que a autonomia existe de fato. O BC resiste à ideia. Segundo técnicos da equipe econômica, a abertura dos votos poderia expor a ataques, especialmente do Congresso, integrantes do Copom que adotassem uma posição impopular.

O fim do sigilo do Copom vem sendo amplamente debatido nos bastidores do governo em função da entrada em vigor, em alguns dias, da Lei de Acesso à Informação. A nova legislação vai assegurar à população acesso a documentos oficiais desprotegidos por sigilo. Por isso, o BC terá de se posicionar sobre a abertura dos votos. Isso valerá tanto para o futuro quanto para o tratamento a ser dado a reuniões passadas do Copom.

BC brasileiro é mais vulnerável, diz Langoni

Especialistas ouvidos pelo GLOBO se dividem sobre o tema. Para o ex-presidente do BC Carlos Langoni e o ex-diretor de Liquidação da instituição Carlos Eduardo de Freitas, é preciso preservar os membros do Copom de pressões políticas, porque o BC tem autonomia operacional, mas não independência. Já o ex-diretor de Política Monetária do BC Carlos Thadeu de Freitas e o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, defendem a divulgação com o argumento que daria mais transparência.

- Com mais transparência, o mercado conhece melhor a visão dos diretores. É até uma chance de o governo provar que o BC tem independência. O presidente mostra que a instituição pode se posicionar livremente e que não vai tirar um diretor só porque ele votou de forma mais ou menos conservadora - disse Agostini.

O BC argumentou que já é bastante transparente porque divulga, uma semana após a reunião, a ata do Copom, na qual justifica a decisão sobre e informa se esta foi ou não unânime. E ressaltou que, dos "20 países que usam o regime de metas, quatro estão nessa condição (Brasil, Indonésia, República Tcheca e Turquia)".

Mas países como Estados Unidos, cujo modelo o Brasil tenta seguir, divulgam os votos dos diretores. Isso também ocorre no Reino Unido. Segundo Langoni, a diferença entre esses países e o Brasil é que a equipe de Alexandre Tombini não tem total independência para agir:

- O BC brasileiro não é independente. Isso gera uma vulnerabilidade maior.

Os especialistas são unânimes em dizer que o BC não trabalha mais com o centro da meta de inflação, de 4,5%, e sim com o teto, de 6,5%.

- Existe uma resolução que determina que a meta tem que ser cumprida. Mas os diretores têm uma visão de que não é necessário trazer a inflação para 4,5% e, assim, sacrificar o crescimento da economia. Com isso, eles assumem um risco - disse Agostini.

Em nota divulgada ontem, a instituição rebateu o editorial "O BC domesticado", do jornal "O Estado de S.Paulo". Nela, Tombini afirma que o BC tem total autonomia para tomar decisões de política monetária, sem interferência de outros órgãos do governo ou agentes econômicos. E diz que no Brasil vigora a liberdade de opinião e pensamento e que Dilma já afirmou que a condução da política monetária é da alçada exclusiva do BC.

COLABOROU Geralda Doca