Título: Ruralistas querem redefinir trabalho escravo
Autor: Éboli, Evandro; Guandeline, Leonardo
Fonte: O Globo, 11/05/2012, O País, p. 16

Projeto tenta conceito menos rigoroso; em São Paulo, fiscais flagram jornada de 15 horas no Minha Casa Minha Vida

Menos de 24 horas após impedirem a votação em segundo turno no plenário da Câmara da proposta de emenda à Constituição que expropria terra de quem explora mão de obra escrava, os ruralistas já apresentaram, ontem, projeto que conceitua o que é trabalho escravo. Mas o texto, do deputado Moreira Mendes (PSD-RO), um dos líderes ruralistas, minimiza os abusos e reduz as situações análogas às de escravos.

Das quatro condutas hoje consideradas pela lei federal como trabalho escravo, duas foram excluídas pelo parlamentar: a submissão do trabalhador a jornada exaustiva e sujeitar o trabalhador a condições degradantes de trabalho. Essas duas condutas são levadas em conta hoje pelo Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho, que fiscaliza e constata a situação de trabalho escravo nas propriedades rurais. Mendes ironizou:

- Isso não caracteriza trabalho escravo. Esses fiscais procuram pelo em ovo - disse Moreira Mendes ao GLOBO.

Porta-voz dos ruralistas, Mendes considera escravo todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob ameaça, coação ou violência, restringindo sua locomoção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente.

Para o parlamentar, o atual conceito gera insegurança jurídica e possibilita o "elevado índice de autos de infração expedidos pelo Ministério do Trabalho e no baixo índice de condenação penal. O projeto do ruralista prevê reclusão de dois a oito anos e multa, para quem cometer trabalho escravo.

Em função da oposição dos ruralistas, o presidente da Câmara, Marco Maia, adiou a votação da PEC para o próximo dia 22. E ficou definido que um projeto conceituando trabalho escravo será votado concomitantemente. Os ruralistas apresentaram o deles.

Denúncia sobre obra do Minha Casa Minha Vida

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) resgataram esta semana 90 operários de uma obra do programa Minha Casa Minha Vida, financiado pelo governo federal em parceria com a Caixa Econômica Federal (CEF), em Fernandópolis, região de São José do Rio Preto, interior paulista. O MPT abriu um inquérito para investigar denúncias de trabalho escravo no local. A obra - de responsabilidade da Geccom Construtora Ltda. - foi embargada na última sexta-feira, quando fiscais do MPE e do MPT visitaram o local após uma denúncia dos trabalhadores à Procuradoria Regional do Trabalho de São José do Rio Preto.

Segundo o MPT, os funcionários tinham jornadas de trabalho de 15 dias diárias, e não recebiam o salário integral. Além disso, outras irregularidades foram encontradas, entre elas o desrespeito às normas de segurança do trabalho e alojamentos precários. Todos esses fatores, de acordo com os trabalhadores, contribuíram para a morte de Antônio Marcos Ferreira Silva, no dia 26 do último mês, dias antes da denúncia ao MPT.

O advogado da Geccom, Shindy Teraoka, negou as acusações de trabalho escravo e salários atrasados.

- Discordamos dessas denúncias. A empresa (Geccom) trabalha no ramo há 25 anos. Tudo será esclarecido e demonstrado ao longo do processo administrativo.