Título: Emendas embalam o namoro
Autor: Vaz, Lúcio; Queiroz, Guilherme
Fonte: Correio Braziliense, 21/09/2009, Política, p. 2

Ministro dos Transportes recebe dois deputados que negociam mudança para o PR, sua sigla. À mesa, liberação de recursos de projetos

No mínimo, ele vai levar a estrada se mudar de partido¿ Rodrigo Maia, presidente do DEM

Cadu Gomes/CB/D.A Press

O MP deveria abrir investigação para ver se houve uma cooptação fraudulenta ou ilícita¿ Roberto Freire, presidente do PPS

Mais deputados seguiram o roteiro traçado pelo deputado Davi Alves Silva (PDT-MA), que esteve no gabinete do ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, a fim de conseguir recursos para o seu estado, enquanto negociava ingresso no PR, partido do ministro. Os deputados José Carlos Vieira (DEM-SC) e Acélio Casagrande (PMDB-SC), em negociações com o PR, foram ao ministério buscando recursos para rodovias e uma ferrovia em Santa Catarina. No dia seguinte ao encontro, Vieira foi à tribuna da Câmara e anunciou: ¿Mais que prontamente, o ministro nos atendeu e autorizou o projeto e o estudo de viabilidade das obras. Agradeço ao ministro Alfredo Nascimento¿.

O presidente nacional do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), comentou o conteúdo da reportagem publicada no Correio, na última segunda-feira, sobre o assédio de Nascimento a Davi Alves. Em audiência ocorrida em 24 de junho, o ministro autorizou a liberação de recursos para o estudo de viabilidade de uma estrada em Imperatriz. Um vídeo mostra o comentário do ministro com Davi: ¿Rapaz, tu não tá nem no partido e já tá conseguindo arrancar as coisas daqui. Imagina quando estiver no partido, não é?¿. Maia afirmou que, ¿cinco anos atrás, essa matéria dava CPI¿. ¿Até falei isso com o Caiado. É inacreditável¿, disse Maia, referindo-se ao líder democrata na Câmara, Ronaldo Caiado (GO).

Sobre a recente audiência de Vieira, Maia disse: ¿No mínimo, ele vai levar a estrada se mudar de partido¿. O vídeo também foi assistido pelo presidente nacional do PPS, Roberto Freire. ¿Há comentários de que essas coisas estão sendo feitas e que estão oferecendo até dinheiro. Não é mais mensalão, porque não é para apoiar o governo, mas é uma tentativa de cooptar. Mas fica difícil comprovar. Tem esse caso do ministro dos Transportes, em que há uma gravação. Acho que o Ministério Público deveria abrir uma investigação para ver se houve uma cooptação fraudulenta ou ilícita, com recursos públicos, vinculada a obras públicas. E a partir de um agente público, no caso, um ministro. Num primeiro momento, aquilo me parece claro.¿

Negociações

Vieira foi ao gabinete de Nascimento em 26 de agosto. Estavam presentes o prefeito de Papanduva, Luiz Saliba, o presidente da Câmara de Vereadores do município, Ademar Lima, e o representante da cidade de Mafra, o empresário Hebert Werka. ¿O intuito da audiência era o de solicitar ao ministro apoio para a melhoria de estradas de seus municípios. Orgulhei-me da audiência de ontem. Conseguimos, juntamente com o deputado Nelson Goetten, autorização do ministro para essas obras. Penso que assim devem caminhar o país e nossos governantes¿, disse Vieira da tribuna da Câmara.

Vieira disse ao Correio que está deixando o DEM porque a direção do partido está lançando três candidatos em Joinville, sua principal base eleitoral. ¿Está havendo um suicídio político. O congestionamento de candidatos vai levar a não se eleger ninguém. Fui muito fiel às regras, às votações, mas o partido não soube reconhecer isso. Tem que haver fidelidade de ambas as partes, ninguém pode ser subjugado nem perseguido.¿ Ele confirma as conversas com o PR, mas afirma que não tratou do assunto na audiência com Nascimento. ¿Não conversamos sobre esse assunto. Conversei sobre outros assuntos e na presença de outras pessoas. Não tive nenhuma audiência com ele particular.¿ Mas admitiu que o ministro sabe das negociações. ¿Ele sabe que foi feito o convite para mim.¿

Casagrande negocia o ingresso no PR com Nelson Goetten. Ele se queixa da perda de espaço político em Criciúma. ¿Eu sou deputado federal, e em cima de mim vem outro candidato com uma condição muito mais favorável, com estrutura, na mesma cidade.¿ Questionado, na última quinta-feira, se teve alguma conversa com Nascimento, respondeu: ¿Não, com o ministro não. A não ser ontem, quando eu fui lá numa missão com os deputados estaduais de Santa Catarina. Fui lá conversar com ele sobre a Ferrovia Litorânea, para ver como está o andamento do projeto. Fomos eu e diversos deputados. Fora isso, não tenho nenhuma relação com o ministro¿.

Baixas

Embora beneficiado pela infidelidade partidária, o PR pode sofrer uma pesada baixa em sua bancada baiana. Dos seis parlamentares, três são da base aliada ao governador Jaques Wagner (PT) e contestam o apoio da legenda à candidatura de Paulo Souto (DEM), declarado pelo senador César Borges, presidente do diretório estadual republicano. Os deputados José Carlos Araújo, Maurício Trindade e Márcio Marinho tentam negociar uma saída pacífica e já têm convites de PP e PDT para se filiarem.

Araújo trava uma acirrada disputa com Borges há dois anos, desde que foi destituído da presidência estadual do PR para acomodar o recém-filiado senador, que deixara o DEM. Além de divergências com a legenda, o deputado Márcio Marinho enfrenta problemas dentro da Igreja Universal do Reino de Deus, da qual é bispo. A congregração aceita lançá-lo candidato em 2010 somente por outra legenda que não o PR. Caso contrário, escolherá outro representante para disputar as urnas.

Outro lado

A assessoria de imprensa do Ministério dos Transportes afirmou que Vieira e Casagrande ¿foram recebidos pelo ministro (Nascimento), em audiências solicitadas pela bancada parlamentar federal de Santa Catarina, em duas ocasiões ¿ 26 de agosto e 16 de setembro. Nessas reuniões, o grupo de parlamentares pediu esclarecimentos a respeito da execução de obras em seu Estado e informou da necessidade de novos projetos¿.

Segundo a assessoria, o ministro apresentou uma série de iniciativas do governo federal, em andamento, especialmente às relacionadas ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). ¿Cabe-nos, ainda, ressaltar que o ministro Alfredo e o Ministério dos Transportes não têm controle, nem se dispõem a controlar, eventuais declarações à imprensa de autoridades recebidas em audiência. Como informado, em outra oportunidade, o ministro não interfere em assuntos partidários.¿