Título: Na estreia tentativa de unificar discurso
Autor: de Freitas, Ailton
Fonte: O Globo, 17/05/2012, O País, p. 10
Na primeira reunião oficial, ontem, os integrantes da Comissão da Verdade decidiram unificar o discurso e, ao menos publicamente, adotar apenas uma posição sobre os temas que irão tratar nos próximos dois anos. Nos últimos dias, membros do grupo divergiram sobre a extensão da comissão, especialmente sobre a investigação também de atos praticados por grupos de esquerda que se opuseram ao regime militar.
Foi decidido que haverá um rodízio na coordenação e o escolhido será uma espécie de porta-voz do grupo. O primeiro coordenador, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp, evitou afirmar se atos de esquerda serão ou não analisados ao dizer que esse assunto ainda não foi debatido.
- Não tratamos do foco da investigação. Vamos seguir o que diz a lei que criou a comissão e trabalhar com as graves violações de direitos humanos. E a lei é clara, não terá caráter jurisdicional e nem persecutória.
Após a solenidade de posse da comissão, Dipp afirmou que não há como o Ministério Público utilizar os resultados da comissão para tentar condenar militares que cometeram violações:
- Pelos termos da lei, hoje não. Não temos nenhuma capacidade, nenhum poder persecutório.
Outra integrante da comissão, a advogada Rosa Maria da Cunha disse que atuará de forma equilibrada, sem revanchismos ou ataques aos militares. Ela explicou que ficou estabelecido que o coordenador é quem falará em nome do grupo, que terá posição fechada sobre os temas.
- A compreensão dos fatos que se tem pode ser diferente. Mas vamos nos pronunciar como um órgão colegiado - disse a advogada.
Outro membro da comissão, José Paulo Cavalcanti Filho - advogado e ministro da Justiça no governo Sarney - disse que o grupo ainda definiria que casos serão apreciados. Ele afirmou que recebeu uma lista de 119 casos de atentados e assassinatos que teriam sido praticados por militantes da esquerda.
- A comissão toda é que vai decidir o que fazer com isso - disse Cavalcanti.
A psicanalista Maria Rita Kehl, também integrante da comissão, afirmou que os atos de militantes de esquerda, no entendimento dela, não serão apreciados.
O ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, que também faz parte do grupo, afirmou que a comissão não terá o objetivo de punir nem de permitir a revogação da Lei da Anistia.
- O que é importante ter claro é que o objetivo da Comissão da Verdade não é a punição. É resgatar a história, resgatar a verdade, e mostrar para que a escola saiba, para que as crianças conheçam, para que o Brasil se prepare para não deixar que aconteça nunca mais - afirmou.
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não quis falar sobre como será a atuação e o tratamento da comissão sobre os crimes do Estado. Perguntado se o foco da comissão são os crimes de agentes públicos, disse:
- Pela lei, o foco é a verdade daquele período e tudo o que disser respeito à verdade terá que ser apurado pela comissão. Isso é o que a lei determina - disse o ministro. (
Evandro Éboli, Maria Lima, Paulo Celso Pereira, Simone Iglesias e André de Souza