Título: O périplo do ¿cara
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 21/09/2009, Política, p. 4

Há um ponto que pode transformar o governo brasileiro em alvo nesta semana: o fato de o país ainda usar muitas usinas termelétricas que geram energia pela queima de carvão e óleo. É preciso que o Brasil faça o dever de casa nessa questão.

Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, exatamente 12 meses após a quebra do gigante Lehman Brothers. Falou das maravilhas da economia nacional. E quer saber, leitor? Foi só o aquecimento para o que virá esta semana, quando o presidente participará de três robustos fóruns internacionais, dois nos Estados Unidos e um na Venezuela.

Do alto de quem conseguiu, com a adoção de medidas, evitar que a crise abalasse com força a economia brasileira, Lula chegará à 64ª Assembleia Geral da ONU quarta-feira como ¿o cara¿. Cercado dos salamaleques diplomáticos de praxe, vai reclamar da resistência dos países do primeiro mundo em regular os seus mercados financeiros.

Mais uma vez, baterá na tecla da necessidade de reformas do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e da própria Organização das Nações Unidas. Voltará a defender um Conselho de Segurança aberto a novos países membros ¿ e se for o Brasil, avalia Lula, melhor.

Quanto à questão climática, outro tema que Lula abordará na reunião da ONU, o foco será a transferência de tecnologia. O governo ainda não fechou a proposta, mas não está descartada a possibilidade de o presidente Lula aproveitar a presença de tantos líderes nos Estados Unidos esta semana para auscultar se há algum espaço para a concessão de crédito carbono em troca da preservação de florestas nativas, onde o Brasil seria beneficiado.

Nesse tema meioambiente, o Brasil, entretanto, não chega tão bem quanto no que se refere ao sucesso econômico e às perspectivas de crescimento. Embora o país seja um celeiro de oxigênio por conta da floresta nativa, há um ponto que pode transformar o governo brasileiro em alvo nesta semana: o fato de o país ainda usar muitas usinas termelétricas que geram energia pela queima de carvão e óleo. Os ambientalistas têm levantado dezenas dessas usinas espalhadas por todo o território brasileiro. É preciso que o nosso país faça o dever de casa nessa questão.

As questões ambientais estarão presentes ainda no encontro do G-20 em Pittsburgh (EUA), no dia seguinte à reunião da ONU, só que em escala menor. O grande tema do G-20, na avaliação dos diplomatas, será mesmo a economia.

Lula se prepara para mostrar como o Brasil, com ações de promoção do investimento e incentivos à indústria ¿ como como a redução do IPI dos automóveis ¿ fez do tsunami uma ¿marolinha¿, com direito a elogios do jornal francês Le Monde. Não é à toa que a imprensa norte-americana nos últimos dias, ao tratar da reunião do G-20, tem se referido a Lula como o ¿carismático¿.

Com a segurança de saber que é tratado lá fora como ¿o cara¿, Lula quer aproveitar esse prestígio internacional para promover o G-20 como foro econômico e financeiro, capaz de pressionar os países do G-8 a regular melhor os mercados e a reformar as instituições ligadas à economia global.

Entre uma reunião e outra, o presidente terá uma lista de encontros bilaterais que, se cumprida à risca com as previsões feitas na semana passada, valerá cada centavo gasto no combustível do Aerolula. Em meio aos pedidos, têm Israel, Coreia, Irã, Reino Unido, Autoridade Palestina, Espanha.

Os sul-americanos estão dispensados dessas conversas porque vão seguir em conjunto para a cúpula da América do Sul e África, em Isla Margarita, nos dias 26 e 27, o ultimo fórum da semana para Lula desfilar as realizações do Brasil. No dia 28, ele retorna ao Brasil apenas para um pit stop ¿ aquela parada estratégica para ver como os ministros se comportaram na sua ausência e trocar a mala, antes de voar para Copenhague.