Título: Estações de menos, frota 3 vezes maior
Autor: desenvolvimento,rioSchmidt, Selma
Fonte: O Globo, 20/05/2012, Rio, p. 20

Só 14 unidades automáticas medem o ar que o carioca respira em 160 bairros

TÉCNICO DO Inea coloca o filtro numa estação semiautomática do Recreio

A ESTAÇÃO automática de medição da qualidade do ar instalada na Escola Tia Ciata, no Centro:parada há meses por problemas de energia

Com uma frota que triplicou em 20 anos - foi de 838.521 para 2.529.432 - os veículos são os grandes vilões do ar que o carioca respira. Eles são responsáveis por nada menos do que 77% das emissões atmosféricas no Rio, segundo o último inventário feito pelo Instituto estadual do Ambiente (Inea). A rede de monitoramento e de informações sobre esses poluentes na capital, no entanto, deixa a desejar. O município, que tem 160 bairros, conta somente com 14 estações automáticas, que medem gases e partículas totais e inaláveis, e repassam informações on-line. A partir de medições das oito unidades operadas pela prefeitura, são elaboradas séries históricas curtas, já que quatro delas só começaram a funcionar em dezembro do ano passado. As outras seis, monitoradas pelo Inea e por indústrias, emitem boletins diários parciais, mas os dados consolidados mais recentes são de 2009.

- Os pesquisadores e a população não dispõem de séries históricas mais longas que estejam atualizadas. O último relatório do Inea sobre a qualidade do ar tem dois anos - lamenta o pesquisador William Wills, do Laboratório Interdisciplinar de Meio Ambiente da Coppe/UFRJ

Quatro unidades

fora de operação

Num universo de poucas estações automáticas, quatro unidades do Inea não estão operando. As instaladas na Escola Tia Ciata, no Centro, e no Hospital Lourenço Jorge, na Barra, dependem de ligações de energia. As outras duas, prontas, aguardam a conclusão de obras físicas para serem colocadas no Engenhão e em Deodoro. Mais 11 - incluídas no chamado pacote olímpico e compradas com R$ 6 milhões do Fundo de Conservação Ambiental (Fecam) - estão sendo montadas na sede do Serviço de Monitoramento da Qualidade do Ar do Inea, no Recreio, e serão colocadas junto a equipamentos esportivos usados durante as Olimpíadas de 2016.

Com o funcionamento dessas 15 unidades, a rede de monitoramento da capital vai mais que dobrar. Mesmo assim, continuará insuficiente, de acordo o professor Sergio Machado Corrêa, do Departamento de Química e Ambiental da Uerj, que, desde 1996 estuda a qualidade do ar na Região Metropolitana:

- O Rio deveria ter mais de 50 unidades para medir gases e partículas, ou seja uma estação automática no vértice de cada área de quatro quilômetros quadrados, descontando locais de mata, como a Floresta da Tijuca.

Jacarepaguá e Irajá: maiores preocupações

A rede de monitoramento da capital é complementada por 21 estações semiautomáticas, que medem apenas partículas totais e inaláveis, a cada seis dias: oito operadas pelo Inea e 12 por indústrias. A prefeitura tem uma unidade móvel, também para medir partículas. Esta ficou até 26 de março, e por três meses, na Uerj, no Maracanã, devendo ser deslocada, esta semana, para uma escola no Jardim América

Ao analisar as medições feitas pelo estado, a presidente do Inea, Marilene Ramos, conclui que Jacarepaguá - região onde acontecerão os principais eventos da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) - e Santa Cruz são as áreas da capital com pior qualidade do ar. Em toda a Região Metropolitana, a situação é mais grave em Duque de Caxias.

- O principal problema de poluição do ar da Região Metropolitana está associado ao tráfego, aos engarramentos. A circulação de veículos sobre vias não pavimentadas também compromete. Mesmo em Santa Cruz, com muitas indústrias, é o tráfego que mais contribui para poluir o ar - diz Marilene - Mas, de uma maneira geral, a qualidade do ar da capital é boa, até por sua localização, à beira-mar.

A presidente do Inea informa ainda que foram aprovados pelo Fundo Estadual de Conservação Ambiental (Fecam) R$ 24 milhões para serem usados no monitoramento do ar do estado. Descontados os R$ 6 milhões usados na compra de 11 equipamentos, o restante será aplicado na modernização da rede.

Já as medições feitas pela prefeitura apontam Irajá como a área com o ar mais degradado da cidade. De janeiro a abril deste ano, a qualidade do ar em Irajá foi considerada ruim em 23 dias. No mesmo período, Campo Grande teve 15 dias de má qualidade do ar. Em São Cristóvão foram três dias; na Tijuca e em Guaratiba, dois; e no Centro e em Bangu, um. Nos lugares medidos por estações automáticas da Secretaria municipal de Meio Ambiente, Copacabana está na melhor situação: nos quatro primeiros meses deste ano, a qualidade do ar foi considerada regular em 75 dias e boa no restante.

- Irajá tem nos preocupado. As emissões do tráfego e de indústrias da vizinhança são levadas, pelo vento, para a região - explica o Gerente de Qualidade do Ar da Secretaria municipal do Meio Ambiente, Marcos Borges.

Entre os gases medidos estão o carbônico (CO), os óxidos de nitrogênio, o ozônio presente na troposfera (porção mais baixa da atmosfera) e os hidrocarbonetos totais. Para o professor Sergio Machado Corrêa, isso não é suficiente:

- Os órgãos de meio ambiente medem os poluentes determinados pela legislação. Mais de cem gases não são medidos separadamente, como o benzeno e o formol, que são altamente poluidores.

Corrêa defende ainda o investimento desses órgãos em simuladores da qualidade do ar:

- Esses equipamentos podem levar a respostas sobre, por exemplo, a eficiência de rodízio de carros, a expansão da rede de metrô e de ônibus rápidos, e a novas formulações para os combustíveis. Podemos usar simuladores para prever o impacto de políticas públicas, antes de elas serem implementadas. Mas, para que sejam confiáveis, eles precisam ser calibrados por uma rede ampliada de qualidade de ar. Também devem ser desenvolvidos por instituições locais, para que não sejam comprados do exterior como caixas-pretas.

Em relação ao vilão do ar, Corrêa justifica que, apesar de os veículos emitirem menos poluentes do que há 20 anos, a frota aumentou muito. A sua grande preocupação, hoje, é com o crescimento do número de motos:

- Uma moto emite 20 vezes mais poluentes que um carro, porque não tem injeção eletrônica, catalisador nem sistema antievaporação.

Os primeiros testes de emissões de gases poluentes e ruídos, feitos em março pelo Detran, revelam que, mesmo mais moderna, a frota do Rio tem muito o que melhorar. No primeiro ano em que veículos poluidores são retirados de circulação, 21% dos vistoriados em março no posto da Rua Santa Luzia (Centro) foram proibidos de trafegar até se adequar. Nos postos de Barra, Campo Grande e Santa Cruz, 17% foram punidos.

Quanto a internações em hospitais da Região Metropolitana com problemas respiratórios, a situação é mais confortável. Estudo feito pelo professor William Wills para o Banco Mundial (Bird) mostra que caiu de 68.690, em 1995, para 51.515, em 2009 (último ano disponível), o número de pessoas internadas.