Título: O desafio de uma geração
Autor: Nogueira, Viviane
Fonte: O Globo, 20/05/2012, Saúde, p. 51

Especialistas discutem as melhores estratégias para combater a obesidade

EM TARDE de auditório lotado na Casa do Saber, na última quarta-feira, os especialistas debateram o tema obesidade e responderam às perguntas do público

encontros o globo

Por que engordamos? O que faz um prato de fritura ser tão mais atraente que um de alface? Como emagrecer e manter o peso? Estas e outras questões foram debatidas no segundo evento da série Encontros O GLOBO Saúde e Bem-estar, que discutiu a epidemia de obesidade, seu impacto nas contas públicas e suas complicações para a saúde, como diabetes, hipertensão e câncer. Em tarde de auditório lotado na Casa do Saber, o cardiologista Cláudio Domênico, membro da Sociedade Europeia de Cardiologia e curador do evento, o endocrinologista Amélio Godoy, a nutricionista Virgínia Nascimento e a psicóloga Mônica Duchesne conversaram sobre o tema e responderam às perguntas do público, com mediação da jornalista Ana Lucia Azevedo, editora de Ciência e Saúde do jornal O GLOBO.

Dados da última pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), divulgados em abril, mostraram que 48,5% dos brasileiros têm excesso de peso e 15,8% são obesos. No total, 64% lutam com a balança. Números da Associação Internacional para o Estudo da Obesidade (Iaso, na sigla em inglês) mostram que 475 milhões de adultos são obesos e 1,5 bilhão estão acima do peso, sendo mais de 200 milhões crianças e adolescentes, uma das maiores preocupações de médicos e autoridades.

- Esta geração é a primeira com previsão de viver menos que seus pais - destaca o endocrinologista Amélio Godoy, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) e da Associação Brasileira de Estudos sobre Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso).

Segundo ele, as principais causas da epidemia são o sedentarismo, a disponibilidade cada vez maior de alimentos, o estresse da vida moderna e a privação do sono, que influencia os hormônios leptina e grelina, ligados à obesidade. Todas as variáveis dessa equação são moduladas pela genética.

- O maior vetor da obesidade é a alimentação, mas pessoas sob o mesmo excesso de calorias engordam de forma diferente e o que determina isso é a genética - afirma.

Inimigo interior sabota os regimes

O componente genético assusta muita gente, mas pode ser vencido. Segundo a nutricionista Virgínia Nascimento, vice-presidente da Associação Brasileira de Nutrição, é possível emagrecer sem fórmulas mágicas e excessos. A eficiência da dieta está relacionada, por exemplo, à introdução de alimentos como vegetais no cardápio diário, para que as combinações mais calóricas sejam uma exceção.

- Na minha época, macarronada e frango assado eram pratos de domingo. Hoje a repetição frequente do que engorda nos leva ao erro - acredita.

Mais do que estar de dieta é preciso planejar a dieta, afirma a psicóloga Mônica Duchesne, coordenadora da área de psicologia do Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia. Ela defende que devemos evitar ou saber o que fazer em possíveis situações de descontrole, como festas:

- É fundamental planejar as situações de risco do dia seguinte e proteger o ambiente de casa. É muito fácil o marido fazer uma pizza e pensar que a mulher de dieta é que tem que se controlar. Mas já imaginou quanto de autocontrole ela terá que ter numa situação dessa? - diz ela.

A psicóloga alerta para os perfis compulsivo e permissivo:

- O compulsivo é perfeccionista, tem um mecanismo de "tudo ou nada" e quando come uma coisa a mais já sai da dieta por dias. O permissivo é aquele que diz "só por hoje" ou "eu mereço". Nenhum dos dois é legal - explica.

Com os hábitos refeitos e as estratégias de defesa em dia, o obeso ainda se depara com os mecanismos de defesa do próprio organismo, sinais de alerta que disparam quando se perde peso.

- Nosso corpo não sabe se perdemos peso porque queremos ou porque estamos em privação no deserto. Quanto mais massa magra tivermos, maior nosso gasto metabólico de repouso, responsável por 70% do nosso peso; de 25% a 30% são de atividade física e apenas 5% de alimentação - explica Godoy, defensor dos medicamentos para tratamento da obesidade. Segundo ele, o obeso precisa da ajuda das drogas, senão fica muito difícil.

O cardiologista Cláudio Domênico ressaltou que em alguns países a preocupação com a obesidade levou a medidas de restrição à indústria. Num artigo publicado na revista científica "British Medical Journal", especialistas recomendam a taxação de 20% do fast food para subsídio de alimentos saudáveis.

Domênico aponta ainda a força de vontade e o papel da família como decisivos na luta contra a doença.

- A força está dentro de nós. Obesidade envolve mudança de comportamento e de cabeça - diz.