Título: País também fica atrás de outros emergentes
Autor: Gomes Batista, Henrique
Fonte: O Globo, 27/05/2012, Economia, p. 35

O Brasil investe pouco e mal em infraestrutura. O volume destinado pelo país ao setor chega a ser de 10% do registrado em outros emergentes. Segundo o mais recente estudo da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), a Rússia direcionou o equivalente a 1,4% de seu Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) a obras em rodovias, ferrovias e linhas aquaviárias em 2010, enquanto o Brasil investiu apenas 0,4% do PIB, de acordo com cálculos da Confederação Nacional dos Transportes (CNT). Já em relação à China a diferença é ainda maior: o país asiático usou o equivalente a 4% de seu PIB em melhoria da infraestrutura. E, no Brasil, a maior parte foi para a malha rodoviária, o que indica que o modal vai continuar à frente de ferrovias e hidrovias nos planos do governo.

- O Brasil diverge em relação a países de grandes dimensões como Estados Unidos, Rússia, China e Canadá, que têm uma grande oferta ferroviária e aquaviária, incluindo o transporte marítimo - afirma Bruno Batista, diretor executivo da CNT.

Ele explica que o caso brasileiro se aproxima dos países europeus, cujos territórios são muito menores.

- É uma distorção. A oferta é preponderante de infraestrutura rodoviária, que ainda é pior do ponto de vista do meio ambiente. Polui mais - acrescenta Batista.

A saga "rodoviarista" do Brasil começou na década de 50, quando o país descartou a estrutura ferroviária montada para escoar a produção de café para os portos e que fazia conjuntamente transporte de passageiros. Isso porque começava a se desenvolver no país a indústria automotiva. O grande problema, afirmam os especialistas, é que a política foi excludente, enquanto poderia ocorrer em paralelo. Em muitos casos, o governo usou caminhos abertos pelas ferrovias para construir, por cima, rodovias. Um caso parecido é o da Turquia, que também adotou um modelo rodoviarista, mas, em vez de inutilizar as linhas de trem, construiu as estradas ao lado dos trilhos. Agora, está recuperando a malha para voltar a usá-la.

- Hoje existe desalinhamento de foco. Fala-se muito em aeroporto. Esse excesso mostra uma visão de curto prazo, de Copa e Jogos Olímpicos, mas isso não interessa aos brasileiros - afirma Paulo Tarso Vilela de Resende, coordenador do Núcleo CCR de Infraestrutura e Logística da Fundação Dom Cabral.

O economista Cláudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria Internacional de Negócios e diretor do International Growth Center, instituto da London School of Economics e da Universidade de Oxford, resume:

- O Brasil investe pouco e investe mal.

No ano passado, 222

mortes em estradas e rios

Frischtak lembra ainda que o investimento é pequeno, não apenas na comparação com outros países, mas com o nosso passado. Investe-se hoje em infraestrutura menos do que na década de 80 do século passado, já após o período do milagre econômico:

- Isso não afeta apenas a nossa competitividade, afeta o bem-estar das pessoas.

O número de acidentes é alto. No Brasil, segundo dados da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), foram 197 mortos em acidentes em linhas de longa distância no Brasil em 2011. No transporte fluvial, que é restrito à Amazônia, foram 25 mortos. Somando os dois, corresponde a um morto a cada 40 horas.

- O Brasil tem que ter dinheiro para grandes projetos. Quem quer ser líder mundial tem que ter infraestrutura. Se não investir, vai sempre estar atrás da demanda. Quanto mais melhorarem as condições econômicas da população, maior a demanda por transporte. E, mesmo com todos os investimentos previstos nos aeroportos, já dá para saber que não vai ser possível fazer frente a esse aumento nos próximos anos - conclui Hostílio Xavier Ratton Neto, professor de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ.