Título: Desmatamento cai no Rio
Autor: Grandelle, Renato
Fonte: O Globo, 30/05/2012, Ciencia, p. 36

AVES NA RESERVA particular do Patrimônio Natural das Agulhas Negras, na Serrinha do Lambari, no Rio: mata preservada

Custodio Coimbra/12-9-2011

A Prefeitura de Águas Vermelhas, no extremo Norte de Minas Gerais, tem como símbolo uma família numa estrada azul, com uma árvore ao lado e uma montanha ao fundo. O apelo ao verde, porém, parece se restringir ao desenho. O município encabeça a lista nacional dos desmatadores da Mata Atlântica, segundo o sétimo Atlas dos Remanescentes Florestais do bioma, produzido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e pela ONG SOS Mata Atlântica entre 2010 e 2011. Foram desflorestados, neste período, 13,3 mil hectares. Dez por cento vieram do município mineiro.

Minas e Bahia tiveram a pior performance do ranking. Oito das dez cidades brasileiras que mais desmataram são de um desses estados. Mesmo assim, prevaleceu uma boa notícia. Nos últimos 25 anos, a média anual de área desmatada no bioma é de 69,4 mil hectares. Portanto, derrubou-se, no último ano, apenas 20% dos outros anos.

A redução do desmatamento no estado do Rio foi elogiada. Os motivos são a criação de parques estaduais, a ampliação das unidades já existentes e a participação da iniciativa privada, por meio de reservas particulares.

- A Mata Atlântica é um bioma extremamente ocupado, onde se concentra 62% da população do país, e completamente fragmentado, com mais de 500 mil trechos de floresta - ressalta Marcia Hirota, diretora de Gestão do Conhecimento e coordenadora do Atlas pela SOS Mata Atlântica. - Sabemos que há o efeito formiga, especialmente nas regiões metropolitanas de Rio e São Paulo. É como chamamos as derrubadas de trechos de mata inferiores a 3 hectares e, por isso, quase impossíveis de mapear. Mas há, também, o esforço de pequenos proprietários de terra para proteger estes fragmentos. Do total de 1.073 Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), mais de 720 são na Mata Atlântica, sendo 115 no Rio.

Nas reservas particulares, segundo Marcia, estão cerca de 80% da cobertura original da Mata Atlântica - daí a importância de que a criação destas unidades seja difundida. Os dois municípios com maior quantidade de RPPNs estão no Rio: Silva Jardim (19) e Nova Friburgo (17).

O novo Triângulo do Desmatamento

Esta é a primeira vez que uma edição do Atlas é concluída em apenas um ano. Criado em 1985, o levantamento começou como quinquenal e, a partir de 2005, aumentou gradualmente sua frequência. Foi analisada cerca de 93% da área total da Mata Atlântica. A cobertura de nuvens impediu a captação de imagens via satélite na Região Nordeste, onde sete estados registram fragmentos da floresta.

- Procuramos incorporar novos dados e dar mais precisão àquilo que divulgamos - assinala Flávio Ponzoni, pesquisador e coordenador técnico do estudo pelo Inpe. - Usamos imagens de satélite que englobam toda a Mata Atlântica, um bioma que vai muito além do litoral e, originalmente, chegava até o Mato Grosso do Sul.

A nova versão do Atlas, divulgada às vésperas da Rio+20 e na mesma semana em que foi comemorado o Dia Nacional da Mata Atlântica, traz boas notícias de outros estados.

- Tivemos ótimo desempenho dos estados do Sul. O Paraná, que já foi o maior desmatador em duas edições do Atlas, teve uma queda representativa: de 3.248 hectares no levantamento anterior para 111 hectares agora - destaca Marcia. - A derrubada da floresta nativa concentra-se em regiões secas, como o Oeste de Minas, no Vale do Jequitinhonha. É uma localidade que chamamos de Triângulo do Desmatamento, onde a cobertura vegetal é transformada em carvão e substituída por eucalipto.

Para Mario Mantovani, diretor de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica, a derrubada da floresta também se deve à intensificação da atividade industrial no Norte de Minas e no sul da Bahia.

- A siderurgia tem provocado transformações em Minas Gerais, o que aumenta a pressão sobre o meio ambiente - explica. Na Bahia, há uma legislação em trâmite para a construção de um porto em Ilhéus, algo sem qualquer sentido e que tornará vulnerável um dos pontos de maior biodiversidade do planeta.

A Mata Atlântica é o bioma mais ameaçado do país. Restam apenas 7,9% de remanescentes florestais com mais de 100 hectares (tamanho considerado representativo para a conservação de biodiversidade). Desconsiderando este critério e contabilizando, também, todos os fragmentos com mais de 3 hectares - limite mínimo para uma área ser captada por satélite -, o índice de cobertura original ainda de pé é de 13,3%.

Segundo Mantovani, o levantamento deste ano é especialmente importante por ter sido realizado pouco antes da sanção, esta semana, do novo Código Florestal.

- Consideramos que a medida provisória é um retrocesso, e que a pressão sobre a Mata Atlântica vai continuar - lamenta. - Este Atlas será uma espécie de marco zero. Houve uma série de medidas erradas patrocinadas pelo governo federal em relação a este código, e, graças ao mapeamento, aconteça o que acontecer, ninguém poderá pensar que é chororô de ambientalista.

Uma lei que regulamenta o espaço e exploração da Mata Atlântica, homologada em 2008, foi vital para aumentar a fiscalização do bioma. Entre 2005 e 2008 - período imediatamente anterior - o abate de floresta foi de 102,9 mil hectares. Nos três anos seguintes, caiu para 44,4 mil hectares. O prefeito de Águas Vermelhas, Valdecy José de Souza, não retornou as ligações feitas pela reportagem do GLOBO.