Título: Perto do zero
Autor: Leitão, Míriam
Fonte: O Globo, 02/06/2012, Economia, p. 26

O país parou. O primeiro trimestre de 2012 teve um crescimento um pouquinho acima de zero: 0,2%. A novidade maior do PIB trimestral divulgado ontem pelo IBGE foi que a indústria cresceu e a agropecuária despencou. O tempo castigou a soja no Sul do país, e a soja é um quinto do PIB agrícola. O pior dado foi a queda do investimento, que reduz as chances de forte recuperação a curto prazo.

Olhando as séries e separando cada componente do Produto, fica claro que o Brasil não tem conseguido manter o crescimento e as desacelerações são tão fortes quanto as altas. Depois de bater em 7,6% no terceiro trimestre de 2010, no acumulado de 12 meses, o crescimento perdeu impulso nos seis trimestres seguidos até chegar a 1,9%. E essa desaceleração é generalizada. A indústria caiu de 10,5%, na taxa em 12 meses, para 0,7%. A agricultura saiu de 6,3% para 0,8%. Serviços, de 5,7% para 2,1%.

Esse é o filme, ele mostra claramente que todos os componentes perdem força e o que tem sustentado algum crescimento é o consumo do governo e das famílias, apesar de estarem também desacelerando. A taxa de investimento da economia, em relação ao PIB, caiu de 19,5% no quarto trimestre para 18,7% no primeiro trimestre de 2012. E a taxa de poupança caiu de 18,7% para 15,7%.

Mas o grande mistério do dado de ontem foi o que aconteceu com a indústria, que cresceu 1,7% no primeiro trimestre comparado ao último do ano passado. Como é possível? Todos os dados antecedentes, como produção industrial, são fracos ou negativos. No acumulado de quatro meses, disse o IBGE na quinta-feira, a indústria teve queda de 2,8%. As indústrias reclamaram tanto que o governo deu ajuda, transfusão de dinheiro subsidiado, barreiras protecionistas, abatimento de impostos para setores.

Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais do IBGE, disse que a produção industrial tem uma medida diferente da que é usada para avaliar a indústria no PIB. A diferença seria que na produção industrial entra só a indústria de transformação e mineração. E foi a construção civil - incluída no dado da indústria do PIB - que cresceu mais. De qualquer maneira, os dados da indústria continuam não conversando com outros dados da indústria do próprio IBGE, da mesma forma que a produção agrícola destoa da forte queda do PIB agrícola. O número positivo da indústria não é resultado do pacote de medidas favoráveis às montadoras porque ele foi adotado após o primeiro trimestre.

Até o mês de maio as informações setoriais ou parciais mostram que vários segmentos industriais continuam fracos, portanto, o segundo trimestre será também de um número acanhado. A boa notícia é que nos meses seguintes a economia deve aquecer, mas para fechar o ano abaixo de 3%. Um dos problemas é a demanda mundial mais fraca por commodities.

- No 1º tri, a contribuição do comércio exterior foi negativa e continuará assim em todo o ano de 2012 - disse José Augusto de Castro, da AEB.

Ontem, bancos e consultores voltaram para seus modelos para reduzir a previsão de crescimento do ano. A Rosenberg Associados revisou de 2,7% para 2,3%. De acordo com Rafael Bistafa, a estratégia do governo de estimular o crescimento via demanda deve encontrar um obstáculo difícil: o nível de endividamento das famílias. O crescimento deveria ser puxado pelos investimentos do governo, mas eles caíram, como divulgou a Receita. O investimento privado está fraco porque ainda há capacidade ociosa na indústria. A RC Consultores revisou de 2,5% para 2,3% a projeção para o PIB.

Sérgio Vale, da MB Associados, acha que é "praticamente impossível" o país crescer mais do que 2,5%:

- Não depende de pacotes do governo, que são irrelevantes, mas de uma melhora do cenário internacional, que não virá neste momento.

Luis Otávio Leal, do ABC Brasil, acha difícil crescer mais do que 2,7%. O Bank of America disse que vai rever para baixo a previsão de 2,8%. O HSBC previa 3,2%, mas vai reduzir. O Itaú, que estava com uma previsão otimista para este primeiro trimestre, de 0,6% de crescimento - em vez do 0,2% que de fato ocorreu -, também vai rever sua projeção, hoje em 3,1%.

O Brasil cresceu menos do que o previsto porque o mundo está em crise? De certa forma. O primeiro trimestre foi mais tranquilo, tudo piorou em maio após as eleições gregas. Alguns países centrais, deste mundo que nos causa problemas, cresceram mais do que nós, como a Alemanha, 0,5%; Estados Unidos, 0,5%; Japão, 1%. Isso sem falar na Coreia do Sul, com 0,9%; México, 1,3%; e Chile, 1,4%. Esse vai ser um ano de baixo crescimento, mas pode melhorar no segundo semestre.