Título: Recessão, mesmo com 100 bi
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Fonte: O Globo, 11/06/2012, Economia, p. 21

A Espanha escapou de uma intervenção, mas a situação continua crítica, com desemprego elevado e retração na economia, afirmou ontem o presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy, em sua primeira declaração depois de o país ter pedido ajuda à União Europeia (UE), no sábado. A oposição, que na véspera criticara o silêncio de Rajoy, quer agora que ele vá ao Congresso explicar o resgate - palavra que Rajoy evita usar. Mas as condições estabelecidas para o socorro à Espanha - que, por ser voltado exclusivamente para o setor financeiro, dispensará o monitoramento do Fundo Monetário Internacional - fez com que Irlanda e Portugal levantassem a possibilidade de rediscutir seus pacotes de ajuda.

Rajoy, que assumiu em dezembro, afirmou que a Espanha só obteve uma linha de crédito de 100 bilhões da UE, a ser usada na reestruturação do setor bancário, por ter adotado medidas de austeridade, reconquistando a confiança dos demais membros do bloco.

- Se não tivéssemos feito o que fizemos nestes cinco meses, o que se teria cogitado ontem (sábado) seria a intervenção da Espanha - afirmou o presidente em entrevista coletiva no Palácio da Moncloa.

Respondendo a perguntas de jornalistas, ele fez questão de ressaltar que o socorro não representa o fim dos problemas econômicos da Espanha:

- O que ocorreu ontem (sábado) foi um passo a mais das muitas coisas que é preciso fazer - afirmou Rajoy. - No Orçamento para 2012, afirmamos que este ano será ruim e o crescimento econômico será negativo em 1,7%. Além disso, o desemprego vai aumentar.

Ele também fez questão de agradecer ao povo espanhol, que vem amargando os sacrifícios decorrentes das medidas de ajuste, aproveitando para alfinetar, mesmo sem citá-lo, seu antecessor, José Luis Rodríguez Zapatero.

- Quero agradecer aos espanhóis, que compreendem algumas decisões duras. Mas acreditem, essas decisões são imprescindíveis para sair dessa situação. Se tivessem sido tomadas antes, talvez não tivéssemos chegado a esse ponto.

Irlanda e Portugal podem pedir tratamento igual

A imprensa local criticou o fato de Rajoy evitar usar a palavra resgate e por ter deixado o anúncio do socorro por conta do ministro da Economia, Luis de Guindos. O presidente do governo espanhol buscou, ao não falar em resgate, estabelecer distância dos outros pactes de ajuda, concedidos a Grécia, Irlanda e Portugal.

Fontes da UE, no entanto, disseram ao jornal "El País" que as condições não são assim tão diferentes. "A ajuda está estreitamente ligada ao cumprimento do pacto fiscal, diga o governo o que disser. As recomendações passam a ser exigências. Ou Madri as cumpre, ou o dinheiro poderia deixar de chegar", disse uma fonte ao jornal espanhol.

A Irlanda já estaria tentando renegociar seu pacote de resgate, fechado em 2010, nos moldes do socorro à Espanha, disse à agência France Presse uma fonte da UE. E em Lisboa, o líder da oposição, António José Seguro, afirmou que o governo precisa exigir uma renegociação, pois todos os membros da UE têm de ser tratados "em pé de igualdade", segundo o jornal "Diário de Notícias".

A oposição se uniu em um pedido para que Rajoy vá ao Congresso explicar os detalhes da operação. O líder do Partido Socialista, Alfredo Pérez Rubalcaba, disse que, assim como fizeram outros países que socorreram seus bancos, é preciso instalar uma comissão para monitorar o processo de saneamento.

- O governo quer que acreditemos que ganhamos na loteria, mas não é bem assim - afirmou Rubalcaba, acrescentando que "o resgate deveria ser usado para resgatar os cidadãos".

Mas houve reações positivas. O comissário de Assuntos Econômicos da UE, Olli Rehn, disse à Reuters estar confiante de que o acordo dará aos mercados "um forte sinal de que a zona do euro está pronta para apoiar a Espanha" na reestruturação do setor bancário". E, em editorial, o "El País" afirmou que o acordo mostra que a UE está apostando no euro e no projeto europeu.

Já no microblog Twitter, a hashtag #RajoyCobarde se transformou em trending topic , com internautas criticando tanto a demora do mandatário espanhol em se manifestar quanto o fato de ele evitar a palavra resgate.