Título: Nem bancos alemães escapam
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Fonte: O Globo, 07/06/2012, Economia, p. 23

MADRI, BERLIM e FRANKFURT

SEDE DO BANKIA em Madri: o movimento dos Indignados está arrecadando recursos junto à população espanhola para iniciar um processo judicial contra o banco

Daniel Ochoa de Olza/AP

Nem os bancos alemães escaparam ilesos da crise na zona do euro. A agência de classificação de risco Moody"s rebaixou a nota de seis instituições financeiras da Alemanha - incluindo o Commerzbank, o segundo maior banco do país - e de três da Áustria, citando "o maior risco de novos choques decorrentes da crise da dívida na zona do euro, somado à capacidade limitada de absorção de perdas". O Deutsche Bank, o maior banco da Alemanha, ainda está sob revisão, informou a Moody"s. Em fevereiro, a agência anunciara a revisão das notas de 114 bancos europeus.

Diante da gravidade da situação, o premier David Cameron e o presidente Barack Obama defenderam ontem "um plano imediato" para resolver a crise, informou o governo britânico. Cameron se reúne hoje com a chanceler Angela Merkel, e Obama vem mantendo contato por telefone com os principais líderes europeus.

Lagarde: líderes trancados até acordo

Já a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine Lagarde, apresentou ontem sua ideia para chegar a um acordo.

- Trancaria os líderes europeus em uma sala, guardaria a chave e os deixaria ali até que concordassem em um plano exaustivo e completo - disse Lagarde em conferência na Letônia.

O rating da dívida de longo prazo do Commerzbank passou de "A2" para "A3", ainda um nível alto. Os demais rebaixados são DekaBank, DZ Bank, Landesbank, Norddeutsche e a unidade alemã do italiano UniCredit. As instituições não comentaram a decisão da agência. Os cortes foram menores que os sofridos por outros bancos europeus, segundo a Moody"s, devido ao "ambiente comparativamente benigno" da economia alemã, com baixo desemprego e endividamento reduzido.

A Moody"s foi bastante rigorosa, já que o sistema bancário alemão é resiliente, disse à Bloomberg News Sandy Mehta, diretor-executivo da consultoria Value Investment Principals:

- Mas, devido à situação na Europa, se os líderes não tomarem decisões firmes, há o risco de os problemas econômicos engolirem a Alemanha também.

Na Áustria, o corte do rating afetou o Raiffeisen Bank, o Erste Group Bank e a unidade local do UniCredit. A agência citou, além da crise do euro, a vulnerabilidade dessas instituições às condições adversas em alguns de seus principais mercados na Europa do Leste.

Apesar do rebaixamento, a situação dos bancos alemães ainda é bem mais confortável que a das instituições financeiras da Espanha, que estão à beira de um resgate financeiro devido ao elevado volume de créditos podres em suas carteiras. O Bankia, nacionalizado há cerca de um mês e que precisa de uma injeção de capital de 19 bilhões, é hoje a principal face da crise.

A Procuradoria espanhola está investigando irregularidades no Bankia, informou ontem o procurador-geral, Eduardo Torres-Dulce. Há suspeitas de fraude, apropriação indébita e falsificação de documentos. O procurador tentou manter a investigação em segredo para "não incendiar o mercado", mas teve de apresentar um processo na Justiça. O documento classifica de estranho o fato de o Bankia ter declarado lucro de 305 milhões poucos dias antes de revelar perdas de 2,979 bilhões.

Já a agência de notícias Reuters revelou que os ativistas do movimento 15-M, os chamados Indignados, estão recolhendo doações junto à população para entrar com uma ação legal contra o Bankia. Até ontem, haviam obtido 15 mil. Outros alvos da ação seriam o BFA, controlador do banco, e seu ex-presidente Rodrigo de Rato, ex-diretor-gerente do FMI. O grupo quer entrar com o processo no próximo dia 14.

Berlim já admite "socorro suave"

Vem crescendo a pressão para que a Alemanha permita que os recursos do fundo permanente de resgate europeu, que entra em vigor em julho, sejam usados para socorrer diretamente os bancos espanhóis, o que não é permitido pela legislação atual. Fontes do governo alemão afirmaram ao jornal espanhol "El País", no entanto, que o governo alemão estaria disposto a admitir que a ajuda tenha um caráter especial, que diferencie o socorro à Espanha daquele concedido a Irlanda, Portugal e Grécia, com condições mais suaves.

Como Berlim não acredita que haja tempo para mudar as regras atuais, ele defende um modelo de resgate no qual a Europa transferiria os recursos ao Fundo de Reestruturação Ordenada dos Bancos (Frob), do governo espanhol. O Frob ficaria encarregado de sanear, liquidar ordenadamente ou promover a fusão dos bancos em dificuldade. Isso cumpriria a exigência alemã de de repassar recursos ao Estado. A diferença frente aos demais pacotes de ajuda seria que o dinheiro seria usado exclusivamente no saneamento do setor financeiro. Com isso, o pacote ficaria entre 50 bilhões ou 60 bilhões, que seria o volume do qual os bancos precisam, segundo estimativas de diversos analistas. Com esse âmbito restrito, haveria a possibilidade de que as condições de austeridade que acompanham todos os pacotes de ajuda ficassem restritas ao setor financeiro espanhol.

A expectativa de socorro aos bancos espanhóis fez com que os mercados europeus fechassem em alta. Londres avançou 2,36%, enquanto Frankfurt e Paris subiram 2,09% e 2,42%, respectivamente. Madri fechou em alta de 2,41%, e o risco-Espanha, indicador da solvência do país, recuou de 500 para 494 pontos centesimais.

* Com agências internacionais

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