Título: De governante onipresente a candidato virtual
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 12/06/2012, O Mundo, p. 26

A presença de Hugo Chávez num grande evento para registrar sua candidatura trouxe de volta aos venezuelanos uma cena que se tornou rara nos últimos meses: o presidente num importante ato público. Tratando-se de um câncer desde junho do ano passado, Chávez apresentou mudanças neste período que vão do próprio discurso até sua maneira de governar. Se antes a ordem era "Pátria socialista ou morte", agora seu slogan é "Viveremos e venceremos", numa clara alusão ao grande desafio que tem pela frente: derrotar o inimigo dentro de si próprio antes de enfrentar os adversários externos.

No último ano, o antes onipresente Chávez se transformou numa espécie de presidente virtual. O intenso tratamento médico o obrigou a passar boa parte do período recluso, viajando em pelo menos um terço do tempo para Cuba e governando a Venezuela do exterior. Se não pode estar presente pessoalmente nos comícios, bonecos em tamanho natural e cartazes o representam.

- Uma gigantesca operação de propaganda está sendo feita como nunca foi visto na Venezuela. O culto à sua personalidade chegou a tal extremo que inserções publicitárias comparam Chávez, abertamente e sem pudor, a Bolívar e a Deus - conta a jornalista Cristina Marcano, autora da biografia "Chávez sem uniforme". - Há uma peça publicitária no canal estatal em que um homem toca um pôster do presidente e diz: "Tenho minha casa graças a este Bolívar." E, ao final, decreta: "Eu tenho um ditado: primeiro Deus, em segundo, meu comandante."

Ao passar o último ano na ponte aérea Caracas-Havana, Chávez transformou seu bem-estar em bandeira política. Um ano atrás, anunciou-se o problema de saúde, inicialmente um abcesso pélvico que mais tarde foi revelado ser um tumor persistente, que o obrigou a passar por três cirurgias, três ciclos de quimioterapia e mais seis de radioterapia. A doença foi declarada derrotada em outubro, mas deu uma nova rasteira em Chávez em fevereiro.

Mesmo com a saúde claramente debilitada, o presidente, de 57 anos, não abriu mão do poder. Sem nunca dar detalhes de suas reais condições, desafiou a Constituição e se recusou a passar a Presidência ao vice, Elías Jaua.

Com o governante comandando o país à distância, os venezuelanos se acostumaram a deixar de ter os longos discursos e as constantes aparições para acompanhar os pensamentos chavistas via Twitter. O perfil @chavezcandanga arrebatou três milhões de seguidores e o transformou no segundo presidente mais popular da rede social, além de ensinar os cidadãos a receber seus pensamentos via pequenas pílulas.

Cerca de 70% dos venezuelanos acreditam que ele vai superar a doença. Nas ruas e na mídia, a intensa propaganda se encarrega de deixar sua imagem bem viva.

- Chávez se vendeu como um super-homem que se sobrepõe a todas as adversidades, e seus seguidores mais fiéis confiam cegamente nele. Mas faltam quatro meses para as eleições e, se sua saúde piorar, seus simpatizantes começarão a se perguntar se ele está apto a governar. Por outro lado, se o presidente tiver de se aposentar ou se morrer antes de 7 de outubro, haverá pouco tempo para trabalhar a candidatura do sucessor, o que fortaleceria Henrique Capriles entre os indecisos - afirma Cristina.

-------------------------------------------------------------------------------- adicionada no sistema em: 12/06/2012 04: