Título: Dilma: Marcas da tortura fazem parte de mim
Autor: Almeida, Amanda
Fonte: O Globo, 18/06/2012, O País, p. 5

BELO HORIZONTE . Em relato inédito, a presidente Dilma Rousseff contou detalhes das sessões de tortura às quais foi submetida na prisão em Juiz de Fora (MG), quando era presa política, na década de 1970. Ela narrou seu sofrimento ao Conselho dos Direitos Humanos de Minas (Conedh-MG), que a ouviu em 2001, nove anos antes de ascender ao Planalto. O depoimento, divulgado pelo jornal "Estado de Minas", expõe um capítulo pouco conhecido da militância política da petista: os castigos em seu estado natal, onde iniciou a trajetória subversiva.

No depoimento, ela diz que foi colocada no pau de arara, tomou choques elétricos, apanhou de palmatória e levou socos.

"Minha arcada girou para o lado, me causando problemas até hoje, problemas no osso do suporte do dente. Me deram um soco e o dente se deslocou e apodreceu", relatou, segundo o documento.

Ela conta ainda que os torturadores ameaçaram agredi-la no rosto, dizendo que, depois de deformada, "ninguém ia querê-la". As sequelas no maxilar só teriam sido corrigidas, através de cirurgias, depois que ela assumiu cargos no governo Lula, em 2002.

A presidente foi ouvida pelo Conedh-MG no Rio Grande do Sul, quando era secretária estadual de Minas e Energia. O depoimento fazia parte de processo aberto por determinação do então governador Itamar Franco para indenizar militantes mineiros. Dilma teria resistido em fazer o relato, tendo resolvido depor na última hora. Ela não precisava falar para ser indenizada por já haver provas da tortura que sofrera, mas entendeu que era importante registrar os fatos para a História. No ano seguinte, foi indenizada em R$ 30 mil.

Com 24 anos, Dilma foi levada para Juiz de Fora em 1972, onde teria ficado por cerca de dois meses. Os militares suspeitavam que ela teria ajudado Ângelo Pezzuti, ex-companheiro no Comando de Libertação Nacional (Colina), em um suposto plano de fuga da penitenciária em Ribeirão das Neves (MG). Eles haviam flagrado bilhetes entre Stela (um dos codinomes dela) e Cabral (codinome de Ângelo).

"O estresse é feroz, inimaginável. Descobri, pela primeira vez, que estava sozinha. Encarei a morte e a solidão. Lembro-me do medo quando minha pele tremeu. Tem um lado que marca a gente pelo resto da vida", descreveu a presidente.

Dilma relatou ter ficado sozinha a maior parte do tempo no cárcere. Segundo ela, a solidão fazia parte da tortura. Ela se lembra de que a mãe ia visitá-la algumas vezes, mas nunca em seus piores momentos. "As marcas da tortura sou eu. Fazem parte de mim", contou.

A reportagem sobre Dilma, que evita falar de seu sofrimento na ditadura, também revela detalhes do dia a dia na cadeia, como os bilhetes que trocava com o ex-marido, Carlos Araújo, escritos em pequenos pedaços de papel envoltos em durex e escondidos pelos presos nos dentes.