Título: Para gurus da equipe econômica, hora é de gastar
Autor: Valente , Gabriela
Fonte: O Globo, 17/06/2012, Economia, p. 39

BRASÍLIA. Para desenhar as medidas de estímulo ao crescimento e fazer com que a economia deslanche, a equipe econômica buscou a opinião de alguns economistas renomados. Os que têm maior trânsito no governo comungam do mesmo pensamento: está na hora de abrir o bolso, gastar e encabeçar um movimento nacional de estímulo ao investimento. Só assim, o Brasil evitará que a crise internacional se instale de vez aqui e cause desemprego. Na visão desses interlocutores, o consumo das famílias não garantirá mais um crescimento duradouro. E negligenciar a expansão da atividade em um momento como o atual seria um suicídio econômico.

Para o economista Delfim Netto, ex-ministro da Fazenda e guru das principais autoridades federais, a principal preocupação que o governo deve ter agora é cooptar o setor privado para investir e, para isso, tem que oferecer boas taxas de retorno.

— Se estimular, o investimento vai produzir mais consumo imediatamente e aumentar a capacidade produtiva no futuro próximo. É um sistema que se retroalimenta — recomenda.

A presidente Dilma Rousseff tem ouvido conselhos de que deve acelerar as concessões e fazer Parcerias Público-Privadas (PPPs). O pacote de estímulos aos investimentos nos estados, anunciado sexta-feira, indica que ela acolheu a sugestão. Essa é a principal arma que o Brasil tem para se proteger da crise que promete ser mais dolorosa que a de 2008, segundo o professor Luiz Gonzaga Belluzzo, outro interlocutor da cúpula do governo.

Na visão do economista, a última coisa que o Brasil pode fazer agora é subestimar a crise que cresce a cada dia, porque a Alemanha teima em não dar prioridade ao crescimento. Para ele, defender ajuste fiscal em vez da expansão da economia — como faz o país da chanceler Angela Merkel — é o mesmo que decretar a própria morte.

— É muito difícil explicar isso porque não tem racionalidade: vão praticar "haraquiri" econômico — destaca Belluzzo.

Belluzzo trabalha com a possibilidade de, não apenas a Grécia sair do euro, mas até a Espanha.

E, nesse cenário, a principal tarefa do governo brasileiro seria impedir o desemprego.

O governo brasileiro tem sinais claros de que a crise é gravíssima.

A presidente Dilma disse aos governadores na sexta-feira que "não vê luz acesa no fim do túnel". E o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, declarou na semana passada que o mundo deve sofrer os impactos da turbulência nos próximos dois anos. Na última ata do Comitê de Política Monetária (Copom), os diretores retiraram a previsão de que o tamanho da crise será de apenas um quarto da grande crise de 2008/2009. Para Delfim, os integrantes do colegiado fizeram certo, porque uma estimativa como essa não tem embasamento teórico.

— Isso era mágica, não tinha a ver com economia. Quando falo isso, estou fazendo mágica e não economia. É um palavrório.

"O que o BC dá com uma mão, a incerteza tira com outra"

Os economistas mais alinhados com a equipe econômica acreditam que, mesmo com os cortes de juros promovidos pelo BC, os bancos devem ficar cada vez mais cautelosos na hora de emprestar para não se exporem a riscos. E esse já é o primeiro sinal clássico de contágio de uma turbulência global.

— O que o Banco Central dá com uma mão, a incerteza tira com outra — constata o economista André Perfeito, da corretora Gradual, ao se referir aos seguidos cortes feitos pela autoridade monetária.

Para o ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda Bernard Appy, se houver um agravamento da crise, os investimentos serão afetados por causa da aversão ao risco. No entanto, ele trabalha com uma solução menos traumática na Europa.

Já o ex-secretário do Tesouro Nacional Carlos Kawall prevê que, se a situação piorar lá fora, internamente haverá impacto no mercado de trabalho, como há quatro anos. E o câmbio em alta poderá pressionar a inflação.

— Mas ainda não estamos vendo isso acontecer — destaca.

Para o economista-chefe da Corretora Votorantim, Roberto Padovani, é evidente que o impacto será mais forte do que o projetado pelos analistas, mas ainda não é possível calcular sua magnitude.

— Ninguém sabe ao certo o que vai acontecer.n