Título: Brasil deve importar mais da Argentina
Autor: Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 21/06/2012, Economia, p. 25

Governo estuda medida como forma de evitar colapso da economia do vizinho

BRASÍLIA . A turbulência na Europa está fazendo passar despercebida outra grave crise que afeta o Brasil. Na luta para fechar as contas, a Argentina impõe cada vez mais barreiras aos produtos brasileiros. Preocupado com a crise e o impacto dessas barreiras na indústria nacional, o governo brasileiro tentará, na semana que vem, em Buenos Aires, destravar o comércio bilateral. Uma das possibilidades é o Brasil passar a importar petróleo e mais trigo dos argentinos. A medida poderia abrir espaço na balança comercial da Argentina para ampliar as importações do Brasil, sem afetar o saldo portenho.

- Foi o que os Estados Unidos fizeram com o Brasil, quando começamos a nos queixar de déficit com eles, e pode nos servir de exemplo. A Argentina é importante para o Brasil, porque é o principal destino dos nossos manufaturados - disse o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro.

A última sondagem da Confederação Nacional da Indústria (CNI) mostra como as empresas brasileiras têm alta dependência do mercado argentino. Na média setorial, a Argentina representa 28% das vendas, mas atinge valores acima de 40% para ônibus e caminhões, têxtil, vestuário e fiação, produtos diversos e químicos.

De um lado, o Brasil não pode permitir que barreiras impeçam a exportação de manufaturados. De outro, não pode deixar que o seu maior comprador de produtos industrializados (22% do total) afunde, pois isso teria impacto direto sobre o setor produtivo brasileiro. Essa é avaliação do governo, que busca uma saída para não prejudicar ainda mais os vizinhos.

- Eles têm de exportar mais para sair do buraco. Não nos interessa uma Argentina em crise. Esses dois itens não prejudicam a produção brasileira - afirmou a gerente da Unidade de Negócios Internacionais da CNI, Soraya Rosar.

Mesmo ciente da delicada situação argentina, o Brasil vai cobrar o fim das barreiras aos produtos brasileiros. E usará como arma as restrições aplicadas à venda de alguns produtos argentinos (azeite de oliva, azeitona, farinha de trigo, batata, chocolate, queijos, vinhos, doces, espelhos, uva passa e maçã), na primeira quinzena de maio, para derrubar as barreiras do lado de lá. É que os produtos sobre os quais incide o licenciamento não automático são perecíveis, o que torna urgente um acordo para sua liberação.

Mas os sinais da Argentina vão em outra direção: em vez de derrubar as barreiras, propôs ao Brasil criar uma lista de ex-tarifários que englobe todos os importados, ou seja, quer que todo o Mercosul também adote novas medidas protecionistas. O Brasil é contra por duas razões: fechar as portas para as importações como um todo é um sinal ruim para o mercado e pode pressionar a inflação.

O Brasil aceita negociar até 200 produtos com tarifa extra, mas os argentinos querem 400. Eles insistem em uma lista comum do Mercosul, mas é difícil achar um consenso.

Segundo estudo da CNI, a fatia do Mercosul nas importações argentinas caiu de 31,8% para 29,9% de janeiro a abril deste ano. No mesmo período, a parcela da China se manteve em 13,5%, enquanto a da Europa passou de 16,7% para 19,3%. Até abril, o país obteve superávit comercial de US$ 4 bilhões, às custas principalmente da redução das importações do Mercosul.