Título: Lula já deve ter percebido o fora que deu
Autor: Krakovics, Fernanda
Fonte: O Globo, 21/06/2012, O País, p. 10

Erundina afirma que ex-presidente passou dos limites ao se aliar a Maluf e diz que tempo de TV não pode "sacrificar a História"

BRASÍLIA . Um dia após desistir da candidatura a vice na chapa do PT na disputa pela prefeitura de São Paulo, a deputada Luiza Erundina (PSB-SP) afirmou ontem que fará campanha para o candidato petista Fernando Haddad, mas não participará de eventos com a presença do presidente estadual do PP, deputado Paulo Maluf. Ela afirmou que Maluf tira credibilidade de Haddad devido à sua participação na ditadura militar, por ser um procurado pela Interpol e pelo que ele representa para a política brasileira.

Mais cedo, ao chegar à Câmara, disse que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou dos limites ao articular o acordo com o adversário histórico para ampliar o tempo de TV na campanha de Haddad.

"Você vai à casa de alguém quando tem intimidade"

A deputada não poupou Lula pela fotografia tirada na casa de Maluf, selando a aliança, e criticou o pragmatismo eleitoral petista. Reconheceu que sabia da possibilidade de aliança com o PP, mas disse não imaginar que seria tão explícita:

- Você vai à casa de alguém quando tem intimidade com ela, amizade, respeito. Eu não acho que o Lula tenha respeito por Maluf nem vice-versa. O tempo de TV é importante, mas não a ponto de sacrificar a imagem, a História, os princípios - disse Erundina. - Aquele encontro na casa foi inadequado pelo simbolismo que aquela figura representa na política brasileira e do estado.

A deputada e ex-prefeita de São Paulo disse acreditar que Lula se arrependeu do gesto. Para Erundina, a política tem um caráter pedagógico e a imagem do ex-presidente de braços dados com Maluf, a quem combateu no passado, não contribui:

- O Lula é sensível, intuitivo, ele já deve ter percebido o fora que deu.

Ao chegar à Câmara, ontem de manhã, a deputada disse que foi muito parabenizada por sua desistência. Indagada se Lula teria passado dos limites ao articular o acordo para ampliar o tempo de TV, respondeu:

- Eu acho. Aquilo lá foi ruim. O preço foi alto por uma coisa pequena. Acho que a mídia é importante, mas não determina de forma absoluta o processo eleitoral - disse, ressalvando que o problema de Lula foi ter ido à casa de Maluf, e não ter se ausentado do anúncio de que ela seria vice de Haddad.

Erundina também lamentou o desfecho do episódio, afirmando que acreditava no projeto:

- Lamento, porque o candidato é bom, com chances reais de vitória, e a militância estava animada com a parceria.

A deputada acusou o PT de resgatar o malufismo, que estaria, segundo ela, em decadência. E disse que Maluf vai querer aparecer no horário eleitoral gratuito para tentar limpar sua imagem, além de ter participação na prefeitura, se Haddad vencer:

- Ele (Maluf) quer aparecer com uma outra imagem, que não a de quem está sendo procurado pela Interpol. Ele se higieniza ao lado de forças que não têm nada a ver com o malufismo. Somos o outro lado - disse Erundina. - Ele investiu pesado nesse resgate político. Já estava morto, só faltava enterrar.

No meio da entrevista, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) apareceu para dar um beijo em Erundina, um símbolo dos petistas que também não estão satisfeitos com essa aliança eleitoral. Ela disse que foi um momento "delicado" a decisão "sofrida" de desembarcar da chapa petista, mas resumiu:

- Conviver com essa pessoa (Maluf) não dá.

Um dos parlamentares mais próximos de Erundina na Câmara, o deputado Domingos Dutra (PT-SP) criticou a proximidade de seu partido com Maluf e disse que a socialista agiu corretamente.

Depois de passar a maior parte da entrevista falando mal de Maluf, Erundina caiu em si:

- A gente está perdendo muito tempo falando no Maluf.

E ainda deu mais uma estocada no PT, ao classificar como "babaquice" o slogan que vende Haddad como "o novo":

- Ele (Haddad) tem as melhores condições de estar à frente de um projeto inovador. Não essa babaquice de ter mais idade ou menos idade. Não é isso. O novo é a ousadia na política.