Título: Impasse sobre contas-sujas
Autor: Braga , Isabel
Fonte: O Globo, 23/06/2012, O País, p. 3

Em um fim de semana com convenções partidárias que formalizarão alianças e a escolha dos candidatos, os políticos vivem um clima de incerteza, diante da demora do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em decidir sobre uma questão crucial para as eleições municipais de outubro: a Corte ainda não deu a palavra final sobre a validade, este ano, da regra que autoriza a candidatura só de quem teve contas de eleições passadas aprovadas pela Justiça Eleitoral.

O prazo final das convenções é o próximo dia 30 e o do registro de candidaturas, 5 de julho. O TSE tem adiado a decisão há quase quatro meses, e a tendência é que haja um recuo, já que a regra foi aprovada a menos de um ano da eleição.

Apesar do suspense no ar, a presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, garante que a questão será resolvida antes do fim do prazo dos registros de candidaturas. Haverá três sessões do TSE antes da data-limite. Caso a promessa não seja cumprida, as eleições de outubro correm o risco de repetir a de 2010, com regras nebulosas. Há dois anos, não estava definido se a Lei da Ficha Limpa valeria para aquela eleição, e foram inúmeros os candidatos "pendurados" que disputaram as eleições.

No dia 28 de fevereiro, o TSE aprovou resolução condicionando as candidaturas à aprovação de contas anteriores de campanhas - ou seja, os chamados contas-sujas não podem ter o registro. Em 6 de março, o PT pediu a reconsideração do tribunal e obteve o apoio de 17 partidos. O assunto tem entrado e saído da pauta do TSE desde maio. Anteontem, Cármen Lúcia chegou pautar o recurso dos partidos para julgamento, mas a relatora, ministra Nancy Andrighi, pediu novo adiamento.

Na semana passada, Cármen Lúcia avisou que o tema é prioritário e será resolvido o quanto antes. Ela explicou que os sucessivos adiamentos foram intencionais, para garantir que todos os ministros estivessem devidamente informados sobre as nuances do caso:

- É preciso garantir que a decisão seja definitiva, que os ministros não tenham nenhuma dúvida sobre o assunto no dia do julgamento - disse a ministra.

Justiça Eleitoral: 20 mil têm contas rejeitadas

Em fevereiro, por 4 votos a 3, o TSE decidiu que seria preciso apresentar as contas de campanha e tê-las aprovadas como garantia para se candidatar nas eleições seguintes. Portanto, para registrar a candidatura este ano, o candidato precisa ter tido a contabilidade avalizada pela Justiça Eleitoral. Segundo uma estimativa preliminar da própria Justiça Eleitoral, cerca de 20 mil políticos em todo o país estariam nessa condição, com contas de campanha rejeitadas.

Além do fato de a norma não ter sido aprovada um ano antes das eleições, a tendência do TSE de revogar a regra se sustenta ainda na mudanças na composição da Corte. Desde a polêmica decisão, o então presidente, Ricardo Lewandowski, deixou o TSE. Foi substituído pelo ministro Dias Toffoli. Lewandowski defendeu a exigência das contas aprovadas como condição de candidatura. A expectativa é que Toffoli, que fez carreira como advogado do PT no TSE, tenha posição contrária.

Marcelo Ribeiro também deixou o TSE desde a decisão. Ele votou contra a nova regra. Por enquanto, quem está em seu lugar é o ministro substituto Henrique Neves - que, especula-se, também defende a regra antiga, mais favorável aos partidos.

Os partidos aguardam uma decisão do TSE para breve:

- O TSE deve decidir antes de 5 de julho, o prazo de registro, com certeza. Isso deve ser na semana que vem - disse o advogado do DEM, Admar Gonzaga.

Em maio, para pressionar o TSE, a Câmara aprovou projeto que põe fim à exigência das contas de campanhas aprovadas e reabilita para as urnas os "contas-sujas". A votação, feita às pressas, provocou reações negativas no Judiciário e nos movimentos da sociedade que lutam contra a corrupção.

O projeto aprovado pela Câmara, que ainda depende de votação no Senado, deixa claro que não é preciso ter as contas aprovadas para obter a quitação eleitoral e prevê que, em caso de desaprovação, o candidato pagará "unicamente" multa equivalente ao valor das irregularidades detectadas, acrescido de 10%.