Título: Uma situação preocupante
Autor: Agra Belmon, Alexandre
Fonte: O Globo, 09/07/2012, Opinião, p. 7

Conforme apuração feita pela Organização Internacional do Trabalho, o número de mortes em decorrência de acidentes e doenças relacionadas ao trabalho supera o número de mortos em conflitos armados. Dados estatísticos da OIT demonstram que o Brasil figurava, em 2009, na quarta colocação mundial em número de acidentes fatais e em décimo quinto lugar em números de acidentes gerais.

Informa o site da Previdência Social que no ano de 2009 os riscos decorrentes dos fatores ambientais do trabalho geraram cerca de oitenta e três acidentes por hora e uma morte a cada três horas e meia de jornada de trabalho.

A situação não é menos preocupante em termos de despesa previdenciária. Os gastos do INSS exclusivamente com benefícios acidentários, somados ao pagamento das aposentadorias especiais decorrentes das condições ambientais do trabalho resultaram, em 2009, em valor superior a R$ 14,2 bilhões/ano. Adicionadas as despesas com o custo operacional do INSS em gastos na área da saúde e afins, o valor atinge quantia superior a R$ 56,8 bilhões/ano.

Se não bastasse, o risco de acidentes - e suas reparações - termina compondo o custo operacional, em detrimento dos salários, do consumidor e da capacidade de investimento do Estado.

Para piorar esse lamentável quadro, há o risco de aumento dos índices em virtude das obras necessárias à preparação do Brasil para os megaeventos desportivos (Copa das Confederações, Copa da Mundo e Olimpíadas): construção ou reforma de estádios, aeroportos, hotéis e vias públicas.

São inúmeras as causas dos acidentes típicos e doenças profissionais que incapacitam o trabalhador ou o levam à morte: falhas nos projetos dos sistemas de trabalho, nos equipamentos, nas ferramentas; inadequação ou obsolescência do instrumental utilizado; deficiência nos processos de manutenção dos diversos elementos componentes do trabalho; falta de adequada orientação no manejo dos equipamentos e instrumentos de trabalho; ausência de fiscalização no uso dos equipamentos de proteção e de conscientização do trabalhador e do empresariado; jornadas excessivas que levam à perda de atenção e reflexos; despreparo do ambiente para a execução do trabalho, com exposição do trabalhador a agentes químicos, físicos e biológicos em níveis acima dos padrões normais; desatenção às normas de ergonomia.

Ora, se as causas são identificáveis, o que justifica o lamentável quadro apresentado?

A resposta é óbvia: a falta de conscientização do empresariado para o necessário investimento e efetivo cumprimento das normas de proteção contra os riscos de doenças e acidentes, segundo as mais modernas técnicas de prevenção e uma eficiente fiscalização capaz de reverter tal situação, que se revela uma custosa e desumana chaga.

Na verdade, o custo de prevenção de doenças e acidentes é pequeno em relação aos custos sociais, trabalhistas e previdenciários. Prevenir doenças e acidentes não é custo. É investimento, ainda mais porque acidentes e doenças ocupacionais não acontecem: são provocados.

Em iniciativa pioneira, o Tribunal Superior do Trabalho, sob o comando do presidente João Oreste Dalazen, lançou, no dia 3 de maio de 2011, campanha nacional de prevenção de doenças relacionadas ao trabalho e de acidentes do trabalho. A Carta de Brasília, entre outras recomendações, alerta as empresas de que os acidentes de trabalho são previsíveis e, por isso, evitáveis, sendo a prevenção e gestão de riscos investimento, enquanto a reparação de danos implica prejuízo. Recorda que é dever do empregador cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, obrigação do empregado colaborar no seu cumprimento, e atribuição do Estado promover a respectiva fiscalização.

Essa ação demonstra o acerto da concretização de uma política judiciária inovadora, em que o magistrado precisa realizar os princípios e regras constitucionais de transformação social, como exige a Constituição.

ALEXANDRE AGRA BELMONTE é

desembargador federal do Tribunal

Regional do Trabalho da 1 Região.