Título: A infelicidade inerente ao romance
Autor: Miranda, André
Fonte: O Globo, 11/07/2012, Rio, p. 27

PARATY. Um dos grandes nomes desta Festa Literária Internacional de Paraty, Jonathan Franzen reuniu, ontem à noite, todas as atenções de uma plateia lotada e ansiosa por escutar as palavras do autor da coletânea de ensaios "Como ficar sozinho" e dos romances "As correções" e "Liberdade". A conversa, mediada por Ángel Gurría-Quintana, passou pelo suicídio do escritor David Foster Wallace, pelo 11 de Setembro, pelas famílias infelizes de suas histórias e pelo panorama atual da literatura.

Como já era esperado por aqueles que conhecem Franzen, a mesa foi lenta: o autor americano, de 52 anos, tem um jeito pausado e calmo de falar, o que prejudicou o andamento da conversa e irritou parte do público. Franzen começou citando "Anna Karenina", de Leon Tolstoi, para falar por que há personagens infelizes em seus livros.

- Se tudo está ok com uma pessoa, por que você vai ler sobre ela? Nós sempre exageramos sobre nossas próprias misérias, exageramos sobre tudo - afirmou, antes de dizer que, apesar das aparências, teve uma família feliz. - O que um romancista faz é exagerar nos anos ruins.

Em seguida, Gurría-Quintana perguntou se "Liberdade" seria um livro pós 11 de Setembro, já que "As correções" foi lançado uma semana antes dos atentados nos Estados Unidos.

- O 11 de Setembro não foi um ataque terrorista, foi um ataque político e midiático, baseado num atentado terrorista. Quantas vezes nós já ouvimos que o 11 de Setembro mudou a América? O uso político do atentado foi cínico. Eu não gosto da midiatização do 11 de Setembro - disse. - A questão é que política é uma coisa estranha, nós a sentimos com muita paixão. Ela acaba aparecendo por cima de tudo. Se você chacoalhar qualquer romance, ele se torna político.

Franzen comentou sobre boa parte da literatura ter se tornado mero entretenimento, num tom irônico e um tanto conformado. Ele citou como bons autores brasileiros Bernardo Carvalho, Chico Buarque e Milton Hatoum.

- Hoje, quando um romance me inspira, eu tento passar um tempo comigo mesmo. A verdadeira função do romance não é apenas entreter, mas usar a capacidade do entretenimento para preservar a individualidade e o livre arbítrio do leitor - afirmou, deixando quase para o fim uma bonita citação a seu amigo David Foster Wallace, morto em 2008. - Éramos como irmãos, que se amam, mas brigam por tudo. Fiquei com raiva pelo contraste entre o que eu sabia sobre suicídio e ver a imagem santificada que criaram dele.