Título: Falo sobre a falência porque os Estados Unidos estão em colapso
Autor: Ribeiro, Carolina
Fonte: O Globo, 08/07/2012, Rio, p. 27

PARATY . O convite para participar da décima edição da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip) soou como um presente de aniversário para o escritor Gary Shteyngart. Na véspera da viagem ao Brasil, o russo naturalizado americano completou 40 anos. Já em solo paratiense, Shteyngart participa da mesa "Entre fronteiras", ao lado do inglês, filho de paquistaneses, Hanif Kureishi, com mediação do jornalista Ángel Gurria-Quintana, na Tenda do Telão, hoje, às 16h30m.

- É difícil fazer 40 anos, mas não existe lugar melhor para isso do que Paraty - brinca Shteyngart, e emenda uma piada sobre ter que arrumar o cabelo (ele é quase careca) para tirar foto.

Na mesa, os autores conversam sobre suas sátiras ficcionais da sociedade contemporânea. Enquanto Shteyngart transita entre personagens nativos e estrangeiros, em diferentes cidades e em crise na conjuntura social que experimentam, Kureishi estaciona nas fraquezas da sociedade inglesa.

Inúmeras vezes elogiado por traduzir com ironia, sem perder a elegância, a sociedade americana, o tarimbado autor foi, em alguns casos, quase que um visionário. Não se surpreendeu quando a crise dos empréstimos de alto risco (os subprimes ) tomou os Estados Unidos, em 2008, enquanto escrevia seu terceiro romance, "Uma história de amor real e supertriste" (lançado no Brasil em 2011 pela editora Rocco). Fato similar já estava presente em seu premiado livro, com o qual arrebatou o Bollinger Everyman Wodehouse Prize na categoria literatura cômica e figurou na lista dos mais vendidos do "New York Times".

- Eu falo sobre a falência porque os Estados Unidos estão em colapso. Então, é bom descrever como esses personagens estão se sentindo como indivíduos, tendo como pano de fundo uma sociedade inteira fracassada. Eu amo escrever sobre o homem, sobre o que ele está ou não fazendo certo - explica.

Os protagonistas de Shteyngart - seu primeiro romance foi "O pícaro russo" (ed. Geração Editorial), que lhe rendeu o Prêmio Stephen Crane de Não Ficção, e o segundo, "Absurdistão" (ed. Rocco), considerado o livro do ano pelo "Washington Post" - são normalmente estrangeiros atrapalhados, melancólicos e vítimas dos acontecimentos históricos. A forte presença de imigrantes reflete parte da biografia do autor, que se mudou para os Estados Unidos aos 7 anos e já morou em Berlim e Roma.

Sua primeira ficção conta as agruras de um jovem judeu, radicado em Nova York, que se envolve com a máfia. A história se parece com a segunda, em que um judeu obeso e angustiado pratica atividades ilícitas. O terceiro, o único inteiramente passado nos Estados Unidos, faz uma sátira ao comportamento dos americanos que vivem com smartphones futurísticos pendurados no pescoço.

- O mundo não vai nada bem, vivemos uma crise financeira, e a pior de todas, que vai estourar em cerca de 30 a 40 anos, é a ambiental. As coisas só estão piorando - diz o autor, sem perder o bom humor diante do que considera apocalíptico.