Título: México amplia recontagem de votos
Autor: Martins, Elisa
Fonte: O Globo, 05/07/2012, O Mundo, p. 33

CIDADE DO MÉXICO . Os mexicanos acompanham como novela a resolução do imbróglio político formado após as eleições presidenciais com as denúncias de fraude e compras de voto apresentadas pelo esquerdista Andrés Manuel López Obrador. O representante do PRD não reconhece a contagem oficial preliminar que deu a ele 31,64% dos votos, contra 38,15% do virtual presidente eleito Enrique Peña Nieto, do PRI. Hoje, ao menos um capítulo dessa história será encerrado: o Instituto Federal Eleitoral (IFE) prevê terminar nesta manhã a revisão das atas de cada distrito eleitoral. O processo inclui ainda a recontagem de 78.012 urnas, o equivalente a 54,5% do total - Obrador queria uma nova apuração completa.

Mesmo assim, com a recontagem parcial o país vive uma reprise das eleições de 2006, quando Obrador também não reconheceu a derrota, e com um novo personagem, representado pelos estudantes do movimento "Yo Soy 132", que voltaram às ruas depois das marchas na campanha contra um suposto favorecimento da mídia a Peña Nieto.

Anteontem, os jovens fizeram um plantão na porta do IFE. Alguns chegaram até a bloquear o acesso de funcionários. Eles dizem ter provas de que houve irregularidade em grande parte das seções eleitorais, como o uso de lápis no lugar de canetas e o transporte das urnas até o IFE feito pelos próprios mesários em carros particulares. Para os estudantes, só a revisão das atas oferecerá resultados definitivos.

- Muitos de nós fomos observadores eleitorais no domingo e registramos anomalias que vão além dos vales-compras distribuídos pelo PRI em troca de votos. Apresentaremos essas evidências em breve - afirmou ao GLOBO Luis Fernando Loya, integrante do movimento "Yo Soy 132". - O mínimo que podemos pedir é que o IFE responda a essas irregularidades e puna os responsáveis, sem deixar dúvidas sobre o candidato vencedor, seja qual for.

Nas ruas e nas redes sociais, os mexicanos não descartam a existência de fraudes nas eleições. Os vales-compras e cartões pré-pagos são velha prática conhecida do PRI e de outros partidos. Mas a impressão geral é de que o sistema eleitoral, hoje um dos mais caros do mundo justamente porque nasceu de uma lógica de desconfiança, já não daria espaço para uma fraude com a magnitude da denunciada por Obrador, que fala de suspeitas em 80% das seções eleitorais.

Peña Nieto acusa rival de tentar deslegitimar resultado

Sem mencionar que, ao contrário da polêmica derrota de 0,56 ponto percentual para Felipe Calderón em 2006, desta vez o esquerdista estaria quase sete pontos atrás de Peña Nieto, distância que seria considerada legítima.

- Não se nega que existam irregularidades, mas a autoridade eleitoral funciona no país. Desta vez são três milhões de votos de diferença. É impossível que a recontagem mude esse cenário de maneira significativa - diz o analista político Ezra Shabot.

Peña Nieto disse estar confiante de que o resultado final coincidirá com a contagem preliminar oficial. Em entrevista à BBC, acusou o rival de orquestrar uma campanha para deslegitimar a eleição:

- Quem disse que os vídeos não são armados pelos adversários? Que credibilidade eles têm? Eu os colocaria em dúvida.

Uma reforma na lei eleitoral permitiu a recontagem de votos em situações como a de seções eleitorais com irregularidades, votos para um só partido, diferença entre os dois primeiros candidatos inferior a1 ponto percentual ou menor do que o número de votos nulos.

Obrador já afirmou que, caso a nova apuração não o favoreça, poderia recorrer ao Tribunal Eleitoral, em um novo capítulo da batalha presidencial. Os mexicanos não discutem o direito da luta do esquerdista. Mas, ao insistir em recuperar o fantasma de 2006, ele poderia não só comprometer a possibilidade de uma terceira candidatura presidencial, como reforçar a imagem de mau perdedor.