Título: Um futuro ministro do barulho
Autor: Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 24/09/2009, Política, p. 2

Decisões polêmicas de Toffoli no comando da AGU deverão criar dificuldades em votações no Supremo, caso ele seja confirmado para o cargo no tribunal

Toffoli: especilistas defendem a abstenção em temas abordados pela AGU

Uma coleção de pareceres polêmicos e de divergências com integrantes do próprio Executivo produzem ainda mais polêmica em torno da indicação do advogado-geral da União, Antonio Dias Toffoli(1), para vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). Esta semana, enquanto o indicado de Luiz Inácio Lula da Silva percorria os corredores e gabinetes do Senado fazendo lobby a favor do próprio nome, entidades de movimentos sociais insatisfeitas com decisões tomadas pelo advogado-geral encaminhavam e-mails para os parlamentares criticando a escolha feita por Lula. Nessa campanha, entraram até alguns integrantes do Ministério Público.

Entre os argumentos usados pelos críticos à indicação, estão o fato de que, uma vez confirmado como ministro do STF, o advogado-geral terá a oportunidade de votar matérias sobre as quais já emitiu pareceres. Muitos deles polêmicos e controversos. ¿Mas vale lembrar que isso também ocorreu quando o ministro Gilmar Mendes assumiu uma cadeira na Corte. Ele simplesmente não votava nos casos em que havia atuado anteriormente. Creio que se o Toffoli assumir o cargo, deverá fazer o mesmo e se abster de participar dessas votações. É o correto, apesar de não haver nenhuma lei que o obrigue a fazer isso¿, explica o constitucionalista Ives Gandra Martins.

As negociações contra o nome de Toffoli são fruto da lista de decisões tomadas durante três anos como advogado-geral. A insatisfação dos procuradores, por exemplo, é resultado de parecer da AGU do mês passado. Ao opinar sobre a constitucionalidade da Lei Complementar Federal 75/93 ¿ que permite aos membros do Ministério Público da União fazer investigações e requisitar o auxílio policial ¿ , Toffoli disse ao STF que é preciso limitar o poder dos procuradores de presidir inquéritos em substituição às polícias. Procuradores temem que, se visão da AGU seja confirmada, atuação e os procedimentos hoje realizados pelo Ministério Público serão dificultados.

Dentro de casa A divergência entre Toffoli e integrantes do Executivo tem como foco a Lei de Anistia. Militantes de ONGs se uniram aos ministros da Justiça, Tarso Genro, e da Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vanucci, nas críticas à posição do advogado-geral sobre as punições para torturadores (leia quadro ao lado). Algumas decisões da AGU com Toffoli à frente do órgão também desagradaram agências reguladoras. Em julho, o advogado-geral publicou parecer retirando desses órgãos o poder de sustentar as suas decisões nos tribunais superiores. A revolta com a decisão foi tanta que eclodiu na Câmara. Arnaldo Jardim (PPS-SP) e Eduardo Sciarra (DEM-PR) apresentaram proposta propondo a anulação da portaria da AGU, alegando que a decisão extrapola os limites do ordenamento jurídico superior.

1- Currículo Toffoli se formou em Direito em 1990 e cinco anos depois começou a trabalhar como assessor da liderança do PT na Câmara dos Deputados. Nos anos de 1998, 2002 e 2006, ele advogou para o partido durante as campanhas eleitorais do presidente Lula. Em 2003, foi nomeado subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil e em 2007 assumiu o comando da Advocacia-Geral da União. Desde que seu nome começou a ser cogitado para uma vaga no STF, surgiram críticas de todos os lados. Pesa contra ele o fato de manter uma relação próxima com o PT há anos, de ter sido reprovado em concursos para a magistratura e, agora, de ter sido condenado em primeira instância pela justiça do Amapá por irregularidades no contrato que fechou com o governo. Esta semana ele conseguiu suspender a cobrança da multa de R$ 420 mil à qual havia sido condenado.

Um jeito de ver as coisas

Confira algumas decisões polêmicas da AGU durante o período de Toffoli:

Ex-coronel Em novembro de 2008, a AGU emitiu parecer em defesa do ex-coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra e seu colega Audir dos Santos Maciel (já falecido). Ambos foram acusados pela tortura de presos políticos e pela morte de, pelo menos, 64 deles, entre os anos de 1970 e 1976. Na decisão, a AGU apontou que os 29 anos que se passaram desde os fatos ocorridos durante a ditadura já teriam ultrapassado o prazo prescricional máximo previsto no Código Penal, de 20 anos. Dessa forma, estariam anistiados os torturadores da época. Acabou comprando briga com integrantes do Executivo e com entidades de proteção aos direitos humanos.

Remédios Em junho de 2009, foi a hora de Toffoli desagradar os movimentos ligados às campanhas contra a publicidade de medicamentos e o Ministério da Saúde. A AGU editou portaria pedindo a suspensão das normas editadas pela Anvisa que determinavam diversas restrições aos comerciais de remédios. Em julho deste ano, o advogado-geral da União editou portaria retirando das agências reguladoras o poder de sustentar as suas decisões perante os tribunais superiores. Na prática, a decisão retirou dessas agências a possibilidade de possuírem representações jurídicas independentes para atuação em tribunais superiores, limitando essa atribuição à própria AGU.

Investigação No mês passado, a AGU encaminhou parecer para o Supremo defendendo a limitação do poder de presidir inquéritos por representantes do Ministério Público. Toffoli rejeitou a constitucionalidade de dispositivos que, em tese, poderiam permitir que membros do MP façam investigações criminais em substituição às Polícias Judiciárias, como são chamadas a Civil e a Federal.

Lavagem da rampa Edilson Rodrigues/CB/D.A Press

Religiosos lavaram a rampa do Congresso Nacional num ato contra a aprovação de leis que incentivam a intolerância de cultos. Após a crise política que atingiu o Senado nos últimos meses, o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), autorizou os adeptos de religiões afro-brasileiras lavarem a rampa em comemoração ao Dia da Defesa da Tolerância Religiosa. Vestidos de branco, com turbantes, lavaram a rampa ao som de atabaques. Um cordão de policiais legislativos não permitiu que o grupo chegasse ao alto da rampa. Além da lavagem, os manifestantes realizaram uma caminhada pela Esplanada dos Ministérios em defesa da liberdade religiosa.