Título: Mídia na mira do poder
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 13/07/2012, Mundo, p. 27

Nas últimas semanas, 20 emissoras de rádio e TV do Equador foram fechadas por decisão da Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel), aprofundando ainda mais a tensão entre o governo do presidente Rafael Correa e os meios de comunicação privados do país. A última a sair do ar foi a Rádio Morena, que pertencia ao congressista Luis Almeida, do partido opositor Sociedade Democrática. Na próxima terça-feira, Almeida - que disse ser vítima de "uma ditadura que pretende silenciar a imprensa independente" - comandará uma missão aos EUA, onde será apresentada uma denúncia contra Correa e seu governo na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização de Estados Americanos (OEA) e na ONU.

Também perderam suas licenças as rádios Cosmopolita, Net, Líder, Camil, El Dorado e o canal Telesangay, entre outras. A emissora de maior potência era a Morena, que tinha cerca de 50 mil ouvintes e empregava 25 pessoas. Segundo representantes do setor, nos próximos meses outras 130 rádios e TVs poderiam ser fechadas. A Conatel alega falhas técnicas e descumprimento de normas - como atrasos no pagamento das mensalidades que todos os concessionários de rádio e TV devem realizar ao Estado, como prevê a lei de comunicações em vigência, aprovada em 1995. Foi o argumento usado, por exemplo, contra a pequena rádio El Dorado, onde trabalhavam apenas oito pessoas, na província de Sucumbíos. A rádio devia seis meses. Ou seja, US$ 72.

- Após sermos notificados, realizamos o pagamento, mas o governo não nos deu a menor chance de renegociar. O atraso é comum em rádios que ficam longe da capital, porque não faz sentido percorrer centenas de quilômetros para pagar US$ 12 mensais - afirmou o dono, Otto Flores, ao GLOBO, indicando que o pagamento tem de ser feito em Quito. - A sensação que temos é que o governo está querendo recuperar licenças para redistribuí-las entre seus amigos.

150 policiais contra pequena emissora

De fato, o projeto da Lei de Comunicação atualmente em debate na Assembleia Nacional pela bancada governista prevê reduzir dos atuais 85% para 33% a participação das empresas privadas no controle das concessões de rádio e TV. Outros 33% passariam a ser empresas públicas, e 34%, comunitárias. Paralelamente, está sendo debatido um projeto de reforma do Código Penal que, de acordo com membros da oposição, também busca ampliar o controle sobre a mídia.

- O que nunca entendemos é como o governo pretende passar de 85% para 33%, mas agora está ficando um pouco mais claro - disse o presidente da Associação Equatoriana de Radiodifusão (AER), Roberto Manciati, admitindo que algumas pequenas emissoras têm, sim, dívidas. - No passado, era possível renegociar o pagamento.

O caso da Rádio Morena foi um dos mais graves. Na sexta-feira passada, 150 policiais entraram na emissora, em Guayaquil, ordenaram seu fechamento e confiscaram parte dos equipamentos. Cerca de 30 pessoas que estavam no local protestaram e foram reprimidas com spray de pimenta.

- Estão tentando calar a mídia que não está alinhada com o governo - sentenciou o congressista opositor.

Em meados do ano passado, a Conatel informou que a licença da rádio não seria renovada por falhas técnicas. Segundo Almeida, a infração principal era a antena de transmissão: o equipamento não estaria 450 metros acima do nível do mar, conforme exigido pelo regulamento.

- O morro onde devia ser colocada a antena tinha apenas 350 metros. Era uma regra impossível de ser cumprida, uma desculpa para nos tirar do ar - justificou Almeida.

Nos meses posteriores, ele afirmou que a Conatel se negou a receber o pagamento mensal. E com o argumento da inadimplência, ordenou o fechamento da rádio.

- A lei é para todos - declarou o presidente equatoriano.

Segundo Correa, "trata-se de um processo de depuração, porque (a situação das concessões) era um caos, com frequências ilegais, corrupção, falhas técnicas".

A nova ofensiva do governo equatoriano já provocou reações e críticas por parte de organizações internacionais, como a Repórteres Sem Fronteiras.

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