Título: Governo recorre a força-tarefa para desarmar pauta-bomba na Câmara
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 28/06/2012, O País, p. 3

Missão era evitar aprovação de projetos com impacto nas contas públicas

BRASÍLIA. Às vésperas do recesso parlamentar e com a insatisfação dos deputados da base aliada, o governo acionou seus ministros ontem para evitar a aprovação, na Câmara, de projetos com potencial para provocar enorme impacto nas contas públicas. Os ministros desembarcaram na Casa, conversaram com os líderes e conseguiram barrar a aprovação, ontem no plenário, de projeto que reduz de 42 horas para 30 horas semanais a jornada de trabalho de enfermeiros - se aprovado, tem um impacto estimado de pelo menos R$ 7,2 bilhões por ano nas despesas do setores público e privado.

Além do projeto dos enfermeiros, a "pauta-bomba" inclui ainda a votação do polêmico projeto que trata da divisão dos royalties do petróleo, o que cria um adicional de periculosidade para vigilantes e, na próxima semana, a votação da proposta que acaba com o fator previdenciário.

Elaborada pelo presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), em conjunto com os líderes, a pauta preocupou o governo, que marcou,de imediato, uma reunião comandada pelo ministro Guido Mantega (Fazenda) para tratar da questão previdenciária. Pela manhã, os ministros Alexandre Padilha (Saúde) e Ideli Salvatti (Relações Institucionais) apelaram pela não votação do projeto dos enfermeiros.

Maia negou que tenha proposto uma "pautabomba" e argumentou que, no caso dos enfermeiros, Padilha lhe garantira que a proposta provocaria impacto mínimo nas contas públicas, e que o problema era na iniciativa privada.

- Estamos falando com os grandes grupos. Cada um tem que assumir suas opiniões - reagiu. Os líderes aliados dizem que Marco Maia deu um recado ao governo com a elaboração da pauta com pontos polêmicos: é preciso maior diálogo com os deputados. A maior queixa é que a presidente Dilma Rousseff não dialoga, e a ministra Ideli não tem autonomia para negociar e dar as orientações. Outra insatisfação é com a demora na liberação das emendas parlamentares.

- Quem monta a pauta é o Legislativo. O governo pode exercer seu trabalho, e a Ideli tem que conversar com os líderes. Se tem decisão tomada, se há pressão, não posso ser o que vai segurar tudo - afirmou Maia.

Ao sair da Câmara, Ideli disse:

- A posição é muito clara: não votar matérias que tenham grande impacto por conta da crise (econômica). Tudo leva a crer que a crise será longa, muito longa, companheira. Fizemos todas as ponderações aos líderes.

No plenário, com as galerias lotadas de enfermeiros, o líder do governo, Arlindo Chinaglia (PT-SP), apelou pelo adiamento da votação. Foi vaiado. O líder do PT, Jilmar Tatto (SP), pediu a verificação de quorum, o que inviabilizou a apreciação do projeto. Nas galerias, os enfermeiros não perdoaram:

- PT, cadê você? A enfermagem não vota em você.

À tarde, para evitar o risco de votação do projeto, os líderes governistas recorreram a manobras regimentais. No fim do dia, Marco Maia voltou a presidir a sessão e bateu boca com Mendonça Prado (DEM-SE), que o acusou, no microfone, de não querer votar a proposta. Maia reagiu:

- Quem colocou o projeto na pauta foi este deputado - disse Maia, referindo-se a ele próprio: - Vossa Excelência é um desqualificado. Nunca me procurou para pedir a votação desse projeto, está fazendo proselitismo.