Título: Alívio em clima de velório
Autor: Krakovics, Fernanda; Lima, Maria
Fonte: O Globo, 12/07/2012, O País, p. 3

Senadores dizem que não havia outra saída: cassar quem já morrera politicamente

BRASÍLIA. O desfecho da sessão de ontem deixou uma sensação de alívio entre os senadores. O clima no dia da degola de um colega, como disse o tucano Aécio Neves (MG), era de velório, mas a pena imposta a Demóstenes Torres (sem partido-GO) era a única resposta que os senadores poderiam dar à opinião pública, "para salvar a imagem da instituição". A presença maciça, com a ausência apenas de Mauro Fecury (PMDB -MA), de licença para tratar de assuntos particulares, teve um simbolismo forte e indicava, desde as primeiras horas da manhã, que o resultado não seria favorável a Demóstenes.

A votação estampada no painel a favor da cassação não foi marcada por euforia ou comemoração. Os senadores avaliaram que era preciso enterrar quem já estava morto politicamente.

Um dos autores da denúncia contra Demóstenes, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) disse que não se surpreendeu e lamentou que o senador goiano tenha abusado da defesa da ética e da moralidade antes de ser flagrado defendendo interesses de Carlinhos Cachoeira:

- De todos os crimes de Demóstenes, o pior foi que ele desmoralizou a probidade - disse Randolfe, que considerou que os 19 votos favoráveis a Demóstenes expressam o histórico da Casa. - O Senado tem tradição de não cassar seus membros.

Líder do PSDB, o senador Álvaro Dias (PR), afirmou que o resultado estava dentro das previsões:

- É reflexo da opinião pública. A expectativa era mesmo que pouco mais de 20 poupassem Demóstenes.

Relator do caso no Conselho de Ética, o senador Humberto Costa (PT-PE) evitou classificar como golpe baixo a parte do discurso de Demóstenes em que ele citou suposto envolvimento do petista no "escândalo dos vampiros" - em que parlamentares apresentavam emendas para compra de ambulâncias superfaturadas. Costa era ministro da Saúde e foi inocentado pela Justiça.

- Entendo como um recurso normal da defesa e como desespero por parte dele. O resultado final mostra a seriedade de nosso trabalho - disse Costa.

Logo após o discurso de Demóstenes, Costa pediu a palavra, para contestá-lo:

- Eu nunca fui grampeado em conversas com meliante, com chefe de quadrilha.

O senador Pedro Taques (PDT-MT), relator do processo na Comissão de Constituição e Justiça, considerou desnecessária a citação de Demóstenes sobre a Operação Vampiro.

- Foi deselegante e desnecessário, mas compreendo como parte da defesa. Mas não há comparação entre o caso dele e o de Humberto. Eu conheço todo o processo da Operação Vampiro - assegurou .

Taques integrava com Demóstenes, Ana Amélia (PP-RS) e Randolfe o grupo batizado de "os mosqueteiros" do Senado. Taques, que também era do Ministério Público assim como Demóstenes, refutou o argumento do goiano de que estaria sendo prejulgado:

- Se não tivessem convicção sobre os relatórios do Conselho de Ética e da Comissão de Constituição e Justiça, 56 senadores não condenariam Demóstenes. Não seriam levianos.

O senador Jorge Viana (PT-AC) avaliou os reflexos do episódio na opinião pública:

- Foi cassado um dos maiores quadros da Casa do ponto de vista da competência e atuação parlamentar. Isso de alguma forma vai fazer a população pensar: o que é real e não é? Cria uma situação constrangedora para a classe política, que já não está bem. Essa decisão atinge a todos nós.

Líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA) afirmou que a Casa cumpriu seu papel:

- Não é um sentimento de vingança, vou deixar muito claro. É um sentimento inclusive de justiça e de cumprimento do seu papel (do Senado).

Lindbergh Farias (PT-RJ) disse que a Câmara precisa aprovar o fim do voto aberto para a cassação de mandatos, proposta já aprovada pelo Senado.

- A Câmara não tem outro caminho. Isso é importante para o futuro. Hoje, o Senado pode olhar de cabeça erguida - disse Lindbergh. (C hico de Gois, Fernanda Krakovics, André de Souza e Maria Lima)