Título: Demóstenes pode ser 2 senador cassado
Autor: Krakovics, Fernanda; Sassine, Vinicius
Fonte: O Globo, 11/07/2012, O País, p. 3

Doze anos após a cassação de Luiz Estevão (PMDB-DF), em junho de 2000, o Senado pode tirar hoje, pela segunda vez na História, o mandato de um de seus integrantes. Começará às 10h, no plenário, a sessão que vai decidir o futuro do senador Demóstenes Torres (sem partido-GO), acusado de quebra de decoro parlamentar por ter colocado seu mandato a serviço do bicheiro Carlinhos Cachoeira. O clima entre os senadores é desfavorável a Demóstenes, embora a votação secreta ainda possa causar surpresas.

Se for cassado, Demóstenes não poderá disputar eleições até 2027. O primeiro suplente, que assumirá o mandato, será Wilder Pedro de Morais, um empresário que omitiu boa parte dos bens que possui na prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nas eleições de 2010. Entre os bens que se esqueceu de relacionar estão dois shoppings centers, um em Goiânia e outro em Anápolis (GO).

Wilder é também ex-marido da atual mulher do bicheiro Cachoeira, Andressa Mendonça. Nas eleições de 2010, Wilder foi o segundo maior doador da campanha de Demóstenes, com R$ 700 mil repassados por meio de duas de suas empreiteiras. Conversas telefônicas usadas pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo mostram que Cachoeira atuou para que Wilder fosse escolhido suplente de Demóstenes.

Além dos sete discursos que fez em plenário nesta reta final, Demóstenes Torres enviou ontem a todos os senadores um memorial com sua defesa. Na peça, afirma que foi iludido pelo amigo Cachoeira que, segundo disse, acreditava ser "apenas um empresário de jogos legais". Compara seu processo com o de Luiz Estevão para argumentar que a pena de perda de mandato, no seu caso, seria muito dura.

Estevão perdeu o mandato após ser acusado de participar do esquema de desvio de quase R$ 170 milhões das obras do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo. A obra era controlada pelo ex-juiz Nicolau dos Santos Neto.

Na sessão de hoje, a expectativa é casa cheia, com poucas ausências. Para que a cassação seja aprovada, é preciso que 41 senadores votem a favor da perda de mandato. Como a votação é secreta, os senadores não poderão orientar ou declarar votos. Alguns senadores pretendem defender a cassação em discursos e depois dizer como votaram em entrevistas.

- A mera expressão do voto pode anular a sessão - disse ontem o senador Cícero Lucena (PSDB-PB), primeiro-secretário da Mesa Diretora.

Na Casa, Demóstenes passou de defensor da ética e da moralidade a acusado de ser um "despachante de luxo" de um bicheiro. Há senadores, no entanto, que são contrários à cassação em qualquer circunstância.

Discursando ontem para seis senadores, Demóstenes afirmou que chega à véspera da votação "com a cabeça erguida". Tentando mostrar-se esperançoso, disse que, depois de "enfrentar essa atrocidade", sente-se mais maduro para legislar. Ele chegou a discorrer sobre assuntos aos quais pretende se dedicar.

Hoje, Demóstenes ou seu advogado terá meia hora para as alegações finais. As galerias do plenário estarão abertas para o público.

Se for cassado, o suplente Wilder Morais já entrará precisando dar explicações. Registros da Junta Comercial de Goiás mostram que ele é sócio-proprietário de 24 empresas. Na declaração de bens ao TSE, porém, o patrimônio declarado é de R$ 14,4 milhões e só são listadas 15 empresas. Informações da Receita Federal apontam que pelo menos oito empreendimentos ausentes da declaração de patrimônio foram constituídos antes das eleições de 2010 e, portanto, deveriam ter sido informados ao TSE. É o caso de dois shopping centers: o Bouganville, em Goiânia, e o Brasil Park, em Anápolis.

Wilder aparece como o empreiteiro responsável pelos centros de compra desde as respectivas inaugurações, em 2006 e 2007. Nem os nomes das duas empresas nem o CNPJ delas aparecem na declaração ao TSE, mas apenas a Orca Construtora, que fez parte dos investimentos nos shopping centers.

Também ficaram fora da prestação de contas de Wilder três empresas de prestação de serviços funerários, duas delas constituídas antes de 2010. Neste ano, ele passou a ser sócio de um cemitério em Goiânia. Wilder é dono ainda de empresas do ramo agropecuário, de fabricação de estruturas metálicas, loteamento, incorporação de imóveis, estacionamento e consultoria em gestão empresarial, boa parte ausente da declaração ao TSE.

O GLOBO tentou ouvir o suplente mas, segundo sua assessoria, ele está em viagem de férias.