Título: No Rio, menos da metade da população se declara católica
Autor: Duarte, Alessandra
Fonte: O Globo, 30/06/2012, O País, p. 4

Na Região Metropolitana, evangélicos são majoritários em 11 municípios

Alessandra Duarte, Juliana Castro, Rafael Soares e Simone Candida

A manicure Indiara Carvalho Rocha, de 31 anos, é médium umbandista e não abre mão da proteção de Ogum, Iansã e Oxalá. O auxiliar de escritório João Laenio do Nascimento, de 34, é evangélico da Universal do Reino de Deus, frequenta a Catedral da Fé, na Zona Norte, e é leitor aplicado da Bíblia. Se fossem se deixar levar pela rivalidade religiosa, os dois provavelmente seriam inimigos. Só que se apaixonaram e estão juntos há dez meses. O casal é exemplo da pluralidade religiosa do estado, onde, na Região Metropolitana, apenas dois municípios, Rio e Niterói, têm mais da metade de sua população católica - do total de 19 municípios da região, em 11 os evangélicos superam os católicos.

No total do estado, pela primeira vez, o Censo registra que católicos são menos de 50%, tendo caído de 56% para 46%.

Segundo José Eustáquio Alves, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence/IBGE), a Região Metropolitana do Rio tem sido espécie de criadora de tendências religiosas no país.

- Um estudo que fizemos mostra que a região está em torno de 20 a 30 anos à frente do país. O que ocorre nela acaba ocorrendo no país depois.

- O Rio sempre teve muita diversidade, até pelo fato de ter sido capital da República - destaca Luiz Antônio de Oliveira, coordenador de População e Indicadores Sociais do IBGE. - Em muitas áreas da cidade do Rio de Janeiro e na Baixada, há um peso evangélico muito grande.

No começo do namoro, tanto Indiara Rocha quanto João do Nascimento ouviram críticas e sofreram olhares preconceituosos de parentes e amigos por causa da escolha do parceiro de outro credo. Mas decidiram apostar na relação.

- Nós já nos conhecíamos desde pequenos, morávamos no mesmo bairro e aí, um dia, aconteceu. Ela logo na primeira semana veio, com medo, me dizer que gostava de mim, mas tinha um "problema", que ela era de umbanda. Eu respondi que isso para mim não era "problema", que o importante é o respeito. E este é o segredo. Ela não tenta me convencer que a religião dela é melhor, nem eu tento fazer isso também - diz João, que foi católico até os 19 anos.

- A gente não discute religião. Eu vou às minhas sessões no terreiro e ele vai aos cultos dele. Temos uma boa convivência, sem críticas - comenta Indiara, que cresceu frequentando centros de umbanda.

O casal só admite um ponto que ainda pode causar polêmica no futuro. Não decidiram em que religião vão batizar os filhos que pretendem ter:

- Mas sabemos que, quando nos casarmos, não faremos cerimônia em nenhum das duas religiões - comenta João.

Para Ricardo Mariano, professor de Sociologia da PUC-RS, a expansão das igrejas pentecostais no estado tem relação com as altas taxas de violência urbana:

- É interessante notar o aspecto acolhedor e fraterno das igrejas pentecostais, que afloram em locais com altas taxas de violência urbana, principalmente onde o Estado não se faz presente. Há também outros fatores que explicam esse crescimento, como a maciça presença de migrantes do Norte e Nordeste, desenraizados de suas famílias e carentes de um núcleo familiar - afirma o sociólogo, que também acredita que a baixa ocorrência de áreas rurais no estado, tradicionalmente ligadas às igrejas católicas, explica a queda do Catolicismo no estado.

Já Edin Abumanssur, professor de Ciências da Religião da PUC-SP, credita à capacidade da comunidade evangélica de formar grupos de solidariedade seu crescimento no estado.

- No Rio de Janeiro, é interessante perceber que a igrejas pentecostais substituíram a umbanda, por conta de seu viés mais assistencialista, de resolução mais imediata dos problemas. Além disso, essas igrejas se congregam em redes sociais de apoio, que, na prática, acabam suprindo de alguma forma as carências sociais dos grupos, que vivem em regiões mais pobres, como a Baixada Fluminense.

Em nota, a Arquidiocese do Rio afirma que "a Igreja tem consciência de que, em geral, 10% dos católicos declarados frequentam normalmente as missas aos finais de semana. Em geral, nós atingimos mais a esses católicos que frequentam a Igreja e temos poucos trabalhos de evangelização dos católicos que não frequentam". Segundo a Arquidiocese, porém, "apesar de todo o pluralismo, a Igreja Católica no Brasil continua tendo o maior percentual de presença" e que os dados do Censo "demonstram como é importante os passos que a Igreja tem dado no trabalho do "ano da fé", "nova evangelização", aprofundamento do catecismo e missões populares."