Título: Não há dúvidas sobre a atuação do BC
Autor: Alves, Cristina; Frisch, Felipe
Fonte: Correio Braziliense, 24/09/2009, Economia, p. 31

Presidente do Banco Central nega que possa haver nervosismo no mercado financeiro se ele se filiar a algum partido

Apesar de toda a discussão em torno do seu futuro, possivelmente de volta à carreira política, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, conta que passou mais de 40 dias no exterior, conversou com mais de 450 investidores, e nega que haja preocupação do mercado com a sua atuação, ou uma eventual perda de rumo, caso ele se filie a algum partido político até o fim do mês, prazo da lei eleitoral para poder concorrer nas eleições de 2010. Segundo ele, as preocupações giram em torno do futuro do BC após a sua saída, ocorra ela em abril de 2010 ou em janeiro de 2011: ¿Não há dúvida sobre a atuação do BC, ou a minha própria, filiando ou não.¿

Cristina Alves, Felipe Frisch, Juliana Rangel e Liane Thedim

O GLOBO: O BC teme uma enxurrada de dólares para o Brasil com o novo grau de investimento, concedido pela Moody¿s? HENRIQUE MEIRELLES: O grande resultado para o país, atingindo o grau de investimento na terceira agência, é uma melhora na qualidade e no prazo dos investimentos. O conceito está se consolidando e no póscrise.

Não necessariamente haverá uma enxurrada de dólares, mas, com certeza, haverá uma melhora na qualidade do investimento, menos especulativo e mais real, de longo prazo, para máquinas e equipamentos, novos projetos, seja via investimento direto, private equity (investimento em empresas de capital fechado) ou em ações.

A eventual apreciação do câmbio decorrente da melhora na classificação de risco é uma preocupação extra para o BC? MEIRELLES: O câmbio do Brasil é flutuante, é um sistema vencedor e que nos permitiu acumular mais de US$ 200 bilhões de reserva e enfrentar a crise com sucesso, sendo considerado um país ¿vitorioso¿ pela Moody¿s. O BC tem a política de acumulação de reservas. Momentos de entrada maior permitem maior acumulação, momentos de entrada menor permitem menor acumulação e, em alguns momentos de saída intensa, como no fim do ano passado, o BC vende dólares.

O BC está sempre disposto a comprar quando há excesso e vender se há falta.

Existe algum risco iminente de o BC usar as reservas internacionais vendendo dólares no mercado? MEIRELLES: Não, não há, mas a história mostrou que o seguro existe exatamente para o risco não previsto. Durante muitos anos, dizia-se que o Brasil não deveria fazer essa acumulação pois o cenário era benigno. Vimos que pode haver surpresas.

O senhor foi criticado pelos juros elevados e pelo câmbio flutuante durante muito tempo.

Com a chancela da Moody¿s, qual é o seu sentimento agora? MEIRELLES: É um reconhecimento do sucesso do Brasil na implementação da política econômica nos últimos anos e no enfrentamento da crise, uma das razões (citadas pela Moody¿s). E a nota veio logo após a crise.

Portanto, a política de primeiro atuar nos canais de transmissão da crise, com empréstimos das reservas, venda de dólares no mercado futuro, venda no mercado à vista, liberação de compulsório e, apenas depois do restabelecimento do funcionamento dos mercados, aplicar estímulo fiscal e monetário, foi uma política extremamente bem-sucedida e reconhecida hoje internacionalmente.

A Moody¿s declara isso de alto e bom som para quem quiser ouvir.

Foi isso que evitou que aparecessem as 200 empresas de que se falava na época, com problemas em contratos de câmbio, como Aracruz e Sadia? MEIRELLES: Evitou não só problemas com as que tinham estas operações, como com milhares de outras que seriam prejudicadas, caso tivéssemos uma crise sistêmica e a continuação da desfuncionalidade dos mercados.

O volume de prejuízos ao país teria sido enorme, inimaginável, como está acontecendo em alguns outros. Ficamos longe disso, porque a ação foi muito rápida e muito forte.