Título: A divulgação pode trazer constrangimento
Autor: Souza, André de
Fonte: O Globo, 20/07/2012, O País, p. 3

Para presidente da AMB, informações completas sobre salários do Judiciário violam privacidade

SÃO PAULO. Contrário à divulgação nominal da folha de pagamento, o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Nelson Calandra, considera que a determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) viola o direito à privacidade dos servidores do Judiciário. Segundo ele, a publicação de informações como pensões de alimentos e empréstimos consignados podem trazer uma exposição desnecessária aos funcionários públicos. O dirigente da entidade acredita que o Supremo Tribunal Federal (STF) terá o bom-senso de atenuar as novas regras.

O GLOBO. O senhor avalia como positiva a divulgação nominal da folha de pagamento do Poder Judiciário?

NELSON CALANDRA: O direito à privacidade do cidadão brasileiro me parece ser violado quando é divulgado o nome associado ao salário que lhe é pago. Como não temos, em regra, outra fonte de renda, a não ser o nosso salário, divulgá-lo nominalmente é o mesmo que quebrar o sigilo bancário de alguém sem motivação, por curiosidade de alguns. Nos grandes tribunais, não temos uma varinha mágica para criar um programa, de um dia para o outro, para divulgar dados que digam respeito a nomes e descontos. Isso, de alguma forma, viola o direito à intimidade.

Quais dados do Poder Judiciário, então, deveriam ser divulgados na sua opinião?

CALANDRA: Apenas os salários com os descontos obrigatórios, imposto de renda e previdência social, sem nome de ninguém. A divulgação de, por exemplo, pensão de alimentos e de consignados traz uma exposição desnecessária.

Mas o Poder Judiciário não deve satisfação aos contribuintes sobre os valores dos salários dos seus servidores?

CALANDRA: Ele deve, mas deve também à conservação de algo tão importante quanto o dinheiro público: a privacidade e a intimidade das pessoas. Um moço, por exemplo, servidor de qualquer órgão público, pode se achar vítima de bullying, porque foi publicada uma relação com o seu salário. Se ele era bem cortejado na sociedade, pode sofrer bullying porque não ganha de acordo com sua aparência perante a sociedade.

Se o Poder Executivo tem avançado na divulgação desses dados públicos, por que o Poder Judiciário deve ter um tratamento diferenciado?

CALANDRA: Esse tratamento diferenciado deve ser dado a todos os servidores, não só aos do Poder Judiciário. Eu acho que o Supremo Tribunal Federal terá o bom-senso de modular e atenuar essa questão. A divulgação dessas informações pode trazer constrangimento.

Qual a recomendação da Associação dos Magistrados Brasileiros diante da resolução? Que não sejam informados os dados determinados pelo Conselho Nacional de Justiça?

CALANDRA: Nós temos ponderado sobre esse tema e respeitamos a posição do ministro Carlos Ayres Britto. Nós não vamos deixar de cumprir uma ordem judicial, mas ficamos preocupados com essa quebra de princípios.