Título: ONG denuncia aumento do abuso de poder na Venezuela de Chávez
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 18/07/2012, O Mundo, p. 27

Human Rights Watch acusa presidente de controlar a Justiça e perseguir oposição

BUENOS AIRES . Quatro anos após seu último relatório sobre a Venezuela, um novo documento da Human Rights Watch (HRW) acusou o governo de Hugo Chávez de usar - e abusar - do poder para intimidar opositores. Em 133 páginas, a organização compilou uma série de denúncias que aponta, sobretudo, para a falta de divisão de poderes e a utilização do Judiciário e de organismos como a Comissão Nacional de Telecomunicações (Conatel) para perseguir, ameaçar e intimidar vozes destoantes.

O trabalho já havia rendido ao diretor da ONG para as Américas, José Miguel Vivanco, e a seu subdiretor, Daniel Wilkinson, o título de personas non gratas em Caracas. E em plena campanha para as eleições de 7 de outubro, a Venezuela transformou-se em um dos dez países que a ONG não visita por falta de garantias de segurança.

Perguntados sobre o favoritismo de Chávez, que segundo diferentes pesquisas tem uma vantagem entre 10 e 20 pontos percentuais em relação a seu principal adversário, Henrique Capriles Radonski, os autores do relatório lembraram que a Venezuela não é o primeiro caso de um governo que mantém a popularidade apesar dos abusos.

- Este tipo de governo, como o de Fujimori no Peru, usa o controle da mídia e das instituições do Estado para melhorar suas vantagens em períodos eleitorais. O abuso das redes nacionais de rádio e TV é um claro exemplo - disse Wilkinson ao GLOBO, por telefone.

Segundo ele, Chávez venceu eleições reconhecidas internacionalmente, mas, ao mesmo tempo, seu governo enfraqueceu instituições fundamentais de uma democracia. A pior regressão da Venezuela, segundo a HRW, é o Judiciário, controlado pelo Executivo.

- A Suprema Corte é hoje uma peça central do chavismo, ela se identifica com alegria e entusiasmo com o governo e é,voluntariamente, usada para convalidar e legitimar a agenda oficial - afirmou Vivanco. - O próprios membros do tribunal dizem, publicamente, não acreditar na divisão de poderes e defendem a punição dos que adotam uma atitude contrária à revolução socialista.

Imprensa crítica também seria vítima do Judiciário

O relatório intitulado "Apertando o cerco: concentração e abuso de poder na Venezuela de Chávez" mostra processos envolvendo jornalistas, ativistas de direitos humanos, donos de meios de comunicação e empresas do setor, juízes e políticos locais.

A influência do Palácio Miraflores sobre a Justiça ficou evidente a partir de 2004, quando Chávez obteve vitória esmagadora num referendo sobre sua permanência no poder.

Em dezembro de 2010, depois de a oposição ter recuperado espaço no Parlamento, a bancada chavista renovou o mandato de nove integrantes da Suprema Corte (com Chávez o número de membros passou de 20 para 32). E esses venciam ao longo dos anos para evitar a participação de opositores no processo.

- Foi uma maneira de garantir um Supremo plenamente chavista até, pelo menos, 2020 - explicou Vivanco.

A ONG ressalta que opositores do governo ainda encontram espaços - cada vez menores - para a crítica. E sob riscos de retaliações cada vez maiores. A lista de exemplos é longa, como o caso da juíza María Lourdes Afiuni, presa em dezembro de 2009, no mesmo dia em que concedeu liberdade condicional ao banqueiro Eligio Cedeño, um opositor do governo, acusado de evasão de divisas. Ela foi acusada pelos governistas de aceitar suborno. Continua detida até hoje.

- Antes, os juízes tinham medo de serem questionados pelo governo, agora têm medo de serem presos - observou Wilkinson.

A Justiça também foi acusada de silenciar a imprensa crítica ao governo nos poucos meios de comunicação privados e independentes que ainda operam. Atualmente, o governo conta com o apoio de seis canais de TV públicos, uma agência estatal de notícias, três jornais, quatro emissoras de rádio, além de 244 rádios comunitárias e 36 canais de TV também comunitários.

Do outro lado, resta apenas o canal de TV Globovisión, com quatro processos administrativos abertos, poucas rádios e três jornais que, juntos, não chegam a 300 mil exemplares diários.