Título: Luta pelos órgãos vitais
Autor:
Fonte: O Globo, 23/07/2012, O Mundo, p. 25

Assad recupera bairros de Damasco e rebeldes avançam em Aleppo, centro econômico da Síria

DAMASCO e ALEPPO, Síria

Após quatro dias de uma ofensiva rebelde que atingiu o centro nervoso do regime de Bashar al-Assad, matando quatro de seus membros, o governo sírio recorreu ontem a armamento pesado para conter a revolta nas duas principais cidades do país. Conseguiu, à custa de ataques com helicópteros e com a principal unidade das Forças Armadas - a temida 4 Divisão Blindada - reconquistar dois distritos da capital, Damasco. Mas viu os rebeldes anunciarem a tomada de controle de uma escola militar próximo a Aleppo, a maior cidade do país e o seu coração industrial e de negócios, onde os combates foram intensos.

Ataques aéreos também foram realizados em Deir al-Zour, dizem opositores. O regime nega o uso de aeronaves e afirma apenas ter matado "um grande número de sterroristas".

- Ele está como um médico, abandonando os membros para tentar salvar os órgãos do paciente - disse, sobre o presidente, um diplomata ocidental sob anonimato.

Assad enfrenta há 16 meses uma revolta que, de protestos pacíficos, se tornou guerra civil e fez 18 mil mortos. Na última semana, a mais violenta até agora, 1.261 morreram, segundo o oposicionista Observatório Sírio de Direitos Humanos, sendo pelo menos 79 civis e 24 militares apenas ontem.

Neste período o conflito entrou em uma nova fase, iniciada com a ofensiva dos rebeldes a Damasco e consolidada com o ataque a bomba que matou quatro membros do governo dentro das instalações oficiais na última quarta-feira. Desde então, mais de 2.000 soldados desertaram, dizem opositores.

Ontem, porém, o governo expulsou os rebeldes do distrito diplomático de Mezzeh. Segundo relatos, militares da 4 Divisão - comandada pelo irmão mais novo de Assad, Maher - retomaram também o bairro de Barzeh, onde teriam entrado em algumas casas e executado jovens do sexo masculino. Alguns oposicionistas admitiram que podem ficar sem suprimentos e ser obrigados a fazer "retiradas táticas" de Damasco, que devido aos confrontos já se tornou, em algumas partes, cidade-fantasma. O lixo se acumula e boa parte do comércio está fechado.

Oposição toma 4 posto na fronteira

Os rebeldes, por outro lado, avançaram na região de Aleppo, cidade que durante boa parte da revolta havia sido poupada de confrontos, mas que "pela primeira vez se tornou um campo de guerra", disse uma moradora. Ontem, no quarto dia de conflitos, combates ocorreram junto a uma base da inteligência síria e forças da oposição conquistaram uma escola militar a 16 quilômetros do centro, segundo um general desertor. O Exército usou helicópteros para bombardear forças rebeldes.

- Nós já assumimos o controle das áreas rurais de Aleppo. Agora, falta o centro da cidade - disse Abdulaziz Selame, comandante de um grupo opositor, à agência de notícias turca Anadolu.

Nas fronteiras, os dois lados obtiveram vitórias. Autoridades do Iraque anunciaram que forças de Assad reconquistaram um posto que fora brevemente dominado pelos rebeldes no sábado. Os insurgentes, porém, conseguiram o controle do posto de Bab al-Salama, junto à Turquia. Com este, já são três os postos sob domínio rebelde na fronteira turca, além de mais um na iraquiana. Preocupado com o conflito tão perto de seu território, o governo turco - que apoia os opositores - deslocou veículos militares para a fronteira.

No sábado, o chanceler francês, Laurent Fabius, encorajou os rebeldes, dizendo que "é hora de a oposição começar a tomar controle do país".

Nos campos de refugiados, que abrigam 43 mil pessoas, oito ficaram feridas em desentendimento por causa de água, comida e alojamento. Uma fuga em massa também está ocorrendo para o Líbano, e Israel teme que o mesmo aconteça em direção às Colinas de Golã. O território está a cerca de 30km de Jdeidet Artouz, subúrbio de Damasco para onde Assad enviou ontem tanques a fim de expulsar rebeldes.