Título: FMI reforça pedidos por mais investimentos
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Fonte: O Globo, 24/07/2012, Opinião, p. 6

As relações do Brasil com o Fundo Monetário Internacional jamais foram tão amenas. Mesmo porque, de devedor contumaz, o país se converteu em credor, ao participar do esforço de constituição de fundos multilaterais para evitar a globalização do contágio causado pelos desequilíbrios fiscais europeus - já há algum tempo bem mais graves que o americano.

Mesmo que haja desavenças devido à legítima reivindicação do Brasil de ter mais peso nas decisões do FMI, subestimado diante do tamanho que já alcançou sua economia, as percepções de lado a lado mudaram: o FMI, aos olhos de Brasília, não é mais o ogro das finanças mundiais - até porque deixou de ter ingerência na administração da economia brasileira -, nem o Brasil é mais um daqueles países latino-americanos descuidados com as finanças públicas, sempre ágeis em tentar a via fácil, e equivocada, das pirotecnias heterodoxas para debelar a inflação e voltar a crescer. Hoje, Argentina à frente, há muitos ocupantes deste lugar que já foi brasileiro.

Assim, pela primeira vez, o governo brasileiro permitiu que o Fundo divulgasse ao público a avaliação feita do país em seu relatório anual. Permitiu, claro, porque veio com elogios. Paulo Nogueira Batista Jr., representante brasileiro na direção executiva do Fundo, registrou em seu último artigo no GLOBO, sexta-feira, que as projeções de crescimento para o Brasil feitas pela instituição chegam a coincidir com as do governo - por definição, sempre mais otimistas. O país estaria crescendo na faixa de 4% no último trimestre deste ano, em comparação com idêntico período de 2011.

Como é do feitio do FMI, não há o mesmo otimismo com a inflação. O Fundo discorda que haja espaço para novas reduções da taxa básica de juros (Selic). Mas o importante é que o Fundo reforça a ampla bancada de analistas, de dentro e fora do país, que acham ter chegado o momento de, afinal, o governo transformar em realidade o costumeiro discurso a favor dos investimentos.

Esgotado o uso da alavanca dos estímulos ao consumo para impulsionar a economia - todos os indicadores apontam para o estreitamento da margem de endividamento das famílias -, não há alternativa a não ser acelerar as engrenagens dos investimentos públicos e privados.

Para isso, é preciso - está no relatório do Fundo e os analistas repetem como mantra - elevar a baixa taxa de investimento da economia (na faixa de anêmicos 19% do PIB). E, sem conter o ritmo do crescimento dos gastos públicos em custeio - folha dos servidores, Previdência, etc. -, nada feito.

Estes serão "importantes desafios para o período à frente" - consta do capítulo brasileiro do relatório do Fundo. Não há dúvida. E uma condição imprescindível para isso é o Planalto resistir às pressões do sindicalismo estatal por nova rodada de aumentos salariais acima da inflação, mesmo que, desde 2003, posse do primeiro governo Lula, o funcionalismo tenha sido beneficiado por um reajuste total de o dobro da desvalorização da moeda no período. Ou seja, o poder de compra de seus salários duplicou.

São conhecidas as dificuldades gerenciais do governo para transformar projetos de investimento em realidade. Haja vista a precariedade da infraestrutura do país. Mas, se não resistir à avalanche sindical, mesmo com toda eficiência gerencial o governo pouco poderá fazer.