Título: Nada a estranhar no lucro dos bancos
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Fonte: O Globo, 26/07/2012, Opinião, p. 6

Diante do que tem acontecido nos países mais desenvolvidos, a situação do sistema financeiro brasileiro é invejável. Crises do passado e a necessidade de se controlar a inflação impuseram às instituições financeiras brasileiras uma série de restrições, entre as quais uma baixa "alavancagem", se comparada a padrões internacionais. Na prática, isso significa que os bancos brasileiros emprestam menos que seus congêneres no exterior. E assumem menos riscos.

Mesmo assim, como as taxas de juros eram muito altas e as operações de financiamento se concentravam no curto prazo, o total de crédito por muito tempo correspondeu a menos de um terço do Produto Interno Bruto (PIB) no Brasil, cerca da metade da média das economias mais desenvolvidas. Nos últimos anos, em um processo gradual de alongamento dos prazos de financiamento e de redução nas taxas de juros, o crédito passou a evoluir a taxas anuais de até 20%. Recentemente, o total de crédito atingiu a proporção de 50% do PIB, mas já com uma redução no ritmo de crescimento (as taxas anuais recuarão dos 20% para a faixa de 12% a 14%).

Os bancos brasileiros agora estão mais presentes no crédito imobiliário, usualmente de longo prazo. Além disso, ampliaram suas operações de financiamento de capital de giro das empresas, de curto prazo, e foram com muita sede ao pote nos empréstimos para a compra de automóveis (médio prazo), na suposição de que estariam mais protegidos com a possibilidade de retomada dos veículos no caso da falta de pagamento.

É muito bom que os bancos estejam cada vez mais envolvidos nessa função de intermediários entre os que poupam e os que necessitam de crédito, deixando de ser meros emprestadores do Tesouro Nacional. No entanto, esta retomada do crédito tem sido um aprendizado para o sistema financeiro, assim como para os clientes não habituados a esse tipo de compromisso. O resultado é que os índices de inadimplência aumentaram. Para se prevenirem, os bancos precisaram ampliar reservas capazes de cobrir perdas com eventual falta de pagamento (é a chamada provisão para "devedores duvidosos").

O provisionamento absorveu parte dos lucros e, pela primeira vez em duas décadas, observa-se uma ligeira queda de rentabilidade do setor. No segundo trimestre, por exemplo, o Itaú Unibanco, maior banco privado brasileiro, lucrou R$ 3,3 bilhões, 8,23% menos que no mesmo período de 2011.

Vale frisar que os bancos brasileiros continuam ainda com lucros invejáveis. No entanto, é de se esperar que caminhem para um ambiente de mais normalidade, pois o que existia antes era um quadro de excepcionalidade, a ponto de gerar até indignação de outros setores da economia.

A tendência de redução nas taxas de juros favorecerá novas operações de crédito. Com o aprendizado destes últimos anos, os bancos certamente conseguirão diminuir a inadimplência, e isso se refletirá positivamente em sua lucratividade. Continuarão obtendo bons lucros, o que é muito saudável, por manter o sistema financeiro fortalecido, deixando tranquilos poupadores e tomadores de empréstimos. Talvez não voltem a se repetir as excepcionais taxas de rentabilidade do passado, pois eram índices anormais, que reproduziam na verdade uma situação de desequilíbrio entre os diferentes setores da economia.