Título: Crescem - e preocupam - sinais negativos na economia brasileira
Autor: Valente, Gabriela
Fonte: O Globo, 28/07/2012, Economia, p. 24

Consumo e abertura de vagas perdem força. Indústria fica ainda mais fraca

TURBULÊNCIA GLOBAL

BRASÍLIA. Ao contrário do que se via quando a turbulência financeira assombrou o mundo há três anos, o Brasil não vive mais uma onda forte de crescimento. O consumo - travado por causa do endividamento das famílias - já não consegue dar o fôlego para a economia. A indústria, por sua vez, ainda se ressente da fraca demanda e da falta de competitividade. Ainda assim, o país ainda mantem um mercado de trabalho com desemprego baixo e redução da informalidade. O que, contudo, não é forte o suficiente para criar condições para a recuperação da atividade, que vem sendo adiada a cada trimestre que passa. De todo modo, apesar de números pessimistas, o país deve encerrar 2012 com crescimento - baixo.

Há razões para que analistas comecem deteriorar as expectativas. Setores alvos de benefícios do governo - como o automotivo - começam a demitir. As previsões para a indústria entraram no campo negativo e uma retração de 0,04% é esperada para este ano. O setor industrial fala em "semestre perdido", por causa da queda de produção e emprego, baixa utilização dos pátios das fábricas e aumento de estoques. Já o comércio teve a primeira queda das vendas desde 2009, de 0,8%, em maio. A confiança da indústria voltou para patamares da crise há três anos.

A arrecadação de impostos caiu 6,5% pela primeira vez no ano, porque as empresas lucram menos. E também remeteram 47% menos lucros e dividendos para o exterior no primeiro semestre. Mesmo com o dólar alto - como queria a indústria nacional - houve uma retração das exportações de 45% nos seis primeiros meses do ano.

A criação de empregos com carteira caiu quase 33% nesse período. Menos dinheiro entra no país: o fluxo cambial foi negativo em US$ 1,9 bilhão em julho, por causa do desempenho negativo de exportações e das saídas de investidores. Grandes bancos como Santander, Itaú e Bradesco perdem lucratividade e culpam o alto índice de inadimplência que começa a recuar, mas está ainda no maior nível da História.

Bradesco prevê queda de 1,5% na indústria

Para o professor da Unicamp Luiz Gonzaga Belluzo, um dos principais interlocutores do Palácio do Planalto no campo econômico, as famílias estão no maior nível de endividamento, de 43,3%, e no fim de um ciclo de consumo de bens duráveis.

- As limitações são maiores, o nível de renda é menor - disse Belluzzo. - Não sou eu, mas a torcida do Flamengo, gregos e troianos acham que o governo tem de ir pelo caminho do investimento em infraestrutura para sair dessa crise.

Segundo José Márcio Camargo, da consultoria Opus, o principal sinal de fraqueza é o da indústria que não tem força para reagir nem aos menores juros da História. Hoje, a Selic é de 8% ao ano.

Ele argumentou que, além de não gerar empregos, os salários no setor subiram 10% no último ano. Isso comprimiu a competitividade da indústria já achatada pelo período de câmbio desfavorável e perda de espaço para importados:

- Ficou ainda mais caro produzir no Brasil, mas ao mesmo tempo continua a circular dinheiro, a renda ainda está alta e isso faz com que o crescimento dependa do comércio e dos serviços daqui para frente.

O economista-chefe do Bradesco, Octavio de Barros, espera uma queda de 1,5% para a indústria neste ano e não aposta em uma retomada muito forte no ano que vem, porque há uma sobreoferta de produtos no mundo por causa da crise. Segundo ele, para o PIB brasileiro crescer 4%, uma produção industrial crescendo 1,5% já seria suficiente em 2013.

-Temos alguns bons indícios de que o BC esteja certo ao apostar na retomada partir desse segundo semestre, mas é importante que se diga que estamos falando de um crescimento rodando anualizadamente em torno de 4% e não mais do que isso.