Título: Perfil criminoso de Cachoeira pressiona CPI
Autor:
Fonte: O Globo, 15/08/2012, Opinião, p. 18

A base parlamentar do governo deserdou a CPI do Cachoeira tão logo deu em nada o plano delirante de uma ala do PT de manipular a comissão para pressionar a imprensa profissional e tentar influenciar no julgamento do mensalão. Em vez disso, a CPI se transformou em um fantasma a assombrar esta mesma ala petista e áreas do governo.

Cassado o senador Demóstenes Torres, agente do contraventor Carlinhos Cachoeira junto ao Congresso, e estopim da ideia de se convocar a comissão, esperava-se algo de concreto dos trabalhos de “investigação” de senadores e deputados. Cabem as aspas porque de averiguação a CPI nada faz. Limita-se a convocar infrutíferos depoimentos, aos quais os depoentes quase sempre comparecem para exercer o legítimo direito de ficar com a boca fechada.

De objetivo continua a haver as provas já colhidas nas operações da Polícia Federal em Goiás (Las Vegas e Monte Carlo), das quais emergem ligações perigosas do governador goiano Marconi Perillo (PSDB) com a turma de Cachoeira, um relacionamento ainda não esclarecido do grupo com outro governador, Agnelo Queiroz (PT), de Brasília, e o contato incestuoso entre Cachoeira e a empreiteira Delta.

Mas este é um assunto que não interessa à base do governo. Talvez pelo fato de a Delta, de Fernando Cavendish, ter transitado com grande desenvoltura nos gabinetes de Brasília em que se fecham contratos para obras públicas, fonte, como se sabe, de financiamento de políticos, de preferência via caixa dois, recurso muito vulgarizado nesta primeira fase do julgamento do mensalão, um simples pecadilho — não envolvesse dinheiro sujo. Empreiteira do PAC, a Delta e Cavendish são um assunto que parece causar alergia à CPI.

Gravações reveladas pelo “Fantástico” do último domingo, em que fica exposto um perfil mais amplo do contraventor, conspiram contra a tática do comando da CPI de desidratá-la até o fim. Os grampos mostram que Cachoeira é multidisciplinar na criminalidade. Já se sabia de suas práticas de lobby nos três Poderes da República e no uso de técnicas de lavagem de dinheiro, com as quais enxaguou muitos recursos recebidos da Delta. Mas, com estas gravações, ficou comprovado que o “empresário” da jogatina ordenou pelo menos um sequestro.

A CPI decidiu, ontem, entre outras medidas, reconvocar Cachoeira — cuja nova mulher, Andressa, teve os sigilos corretamente quebrados — e marcar o depoimento de Cavendish. Não se pode ser otimista com estes depoimentos. Nada revelarão, salvo retumbante surpresa.

A revelação de mais uma perigosa faceta de Cachoeira pressiona a CPI a fazer o que se recusa: analisar, com seriedade, o farto material recebido das investigações feitas do conglomerado Cachoeira/Delta e associados. l