Título: Ensino médio a passos lentos
Autor:
Fonte: O Globo, 15/08/2012, O País, p. 3

Ideb 2011 aponta melhora no início do fundamental, que não se mantém nos anos seguintes

A educação brasileira melhora, principalmente no começo da vida do estudante — os anos iniciais do ensino fundamental —, mas cresce devagar nos anos finais, o antigo ginásio, e no ensino médio. Dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2011, divulgados ontem pelo Inep, do Ministério da Educação, apontam que o país não consegue replicar o bom desempenho de um aluno no início da sua vida escolar ao longo das séries: a onda de melhoria da educação perde força à medida que o aluno avança até o antigo 2º grau.

Nos anos iniciais do ensino fundamental, a meta do Brasil para 2011, somando as redes pública e privada era 4,6 — o país ficou com 5, ultrapassando a meta em 0,4 ponto. Nos anos finais, a meta de 3,9 foi superada em 0,2 ponto, com o país ficando com 4,1. No ensino médio, a nota foi de 3,7, igualando a meta, mas sem ganhos significativos. Nessa última etapa, o Ideb caiu em relação a 2009 em nove estados.

A situação do ensino médio preocupa até mesmo na rede privada. Se na rede pública a nota ficou igual desde 2009, na privada subiu apenas de 5,6 para 5,7 (de 2009 para 2011) e ainda ficou 0,1 ponto abaixo da meta.

O quadro do ensino médio é mais grave por causa de outro problema: segundo o Censo do IBGE, há 17% de jovens de 15 a 17 anos — idade na qual já se esperaria que os jovens estivessem nesse nível de ensino — que abandonaram os estudos. Outros 32% estão atrasados, ainda no fundamental. Baseandose em testes de Português e Matemática e na taxa de aprovação dos alunos, o Ideb é o principal indicador para medir o sistema educacional brasileiro. Em 2021, a meta para os anos iniciais é 6; para os finais, 5,5; e para o médio, 5,2.

As redes pública e privada têm resultados dissonantes: nos anos iniciais, a média das públicas foi 4,7. A rede privada teve 1,8 ponto a mais. Nos finais, a diferença foi maior: 3,9 contra 6,0. No ensino médio, a diferença das redes foi de 2,3 pontos.

A desaceleração do ritmo de melhora do desempenho escolar ao longo das séries fica clara nos cálculos feitos por Paula Louzano, da Faculdade de Educação da USP.

Ela viu quantos pontos os alunos da rede pública (nos anos finais do fundamental e no ensino médio) melhoraram entre 2005 e 2009, e entre 2009 e 2011, e comparou o resultado dos dois grupos. Conclusão: de 2007 a 2011 os alunos também melhoraram, mas menos do que em anos anteriores.

— Os alunos chegam mais preparados nos níveis subsequentes, porque as notas são mais altas, mas a capacidade de acrescentar valor à educação está diminuindo. Se você quer ter avanço, não precisa só melhorar notas, precisa que o ritmo de avanço se mantenha — diz Paula.

Diretora-executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz fez um estudo a partir do Ideb de 2005, para mostrar a evolução do índice nos estados. Descobriu que o Ceará foi o estado que mais avançou nos anos iniciais do fundamental; saltou de 3,2 para 4,9:

— Numa área em que os municípios são os principais responsáveis, o Ceará conseguiu pegar os bons resultados da alfabetização em Sobral e replicar. Esse pacto entre estado e municípios é fundamental.

O maior investimento no fundamental é o que explicaria em boa parte o melhor resultado desse nível, diz o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara:

— Dos recursos públicos para Educação, 65% são para o fundamental; 13% para o médio; 7% para o infantil; e 15% para o superior. A aposta foi no fundamental, mas tem de haver continuidade de investimento nos anos seguintes, principalmente porque é no médio que há mais professores sem formação adequada, e falta de estrutura e projeto pedagógico adequados.

Com o país avançando menos nos anos finais do fundamental, Priscila Cruz acredita em um problema estrutural:

— O currículo é fragmentado, o professor é da disciplina e não da turma, o MEC não tem um projeto específico para o período e, ao contrário dos anos iniciais, quando o município é o maior responsável pela rede, nesses anos nem os municípios nem os estados se sentem os responsáveis.

— Os anos iniciais são motivo de comemoração. Os anos finais, de preocupação. E o ensino médio, de decepção — resume Francisco Soares, do Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais da UFMG.

— Os anos finais, não são todos os alunos que concluem, só 70% deles. E, como não são todos os que chegam ao ensino médio, os que chegam, em tese, são melhores alunos, e mesmo assim não temos melhora significativa no médio.

Com o Brasil tendo tido avanço ínfimo — 0,3 ponto entre 2005 e 2011 — no ensino médio, o Amazonas se destacou: passou de 2,4 para 3,5 na média total do estado (considerando só a rede estadual, variou de 2,3 para 3,4). Em 2011, o estado com melhor Ideb é Santa Catarina com 4,3 (4,0 na rede estadual). Os piores são Pará, que se manteve com Ideb 2,8, e Alagoas, que caiu de 3,0 para 2,9 na média total.

"ENSINO MÉDIO NOTURNO DEVE ACABAR"

Pesquisador em educação, Ruben Klein crê que é preciso reformular o ensino médio. Para ele, além de resolver o déficit de professores, devese acabar com o ensino noturno:

— Cada escola tem seu projeto pedagógico e isso não funciona. É preciso ter diretrizes bem definidas. O jovem tem que estudar de dia. O ensino noturno tem menos horas em sala de aula e as pessoas ainda chegam atrasadas e saem mais cedo, além de a cobrança ser menor.

— As escolas de ensino médio não flexibilizaram o currículo. Precisam achar uma maneira de seduzir o jovem— completa Ricardo Henriques, superintendente do Instituto Unibanco.

Coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, Naércio Menezes Filho acrescenta mais razões para que a melhora no início da vida escolar não continue ao longo das séries:

— O aumento da escolaridade dos pais e da renda, com alimentação melhor e bens culturais, influenciou nos anos iniciais. Mas não continua até o médio; aprendizado é cumulativo, e problemas de anos anteriores aparecem no fim — diz ele, lembrando que o parâmetro do Ideb, a situação dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em 2005, já estaria defasado: — Os países não estão mais como em 2005. Eles melhoraram também.