Título: Cartões ficam sem xerife
Autor: Cristino, Vânia
Fonte: Correio Braziliense, 30/09/2009, Economia, p. 12

Banco Central não fiscalizará setor. Consumidor sai perdendo

Altamir Lopes, do BC, avalia que o aumento do crédito contribuirá para a queda da inadimplência

A área econômica já decidiu: a regulamentação do cartão de crédito vai ficar fora das asas do Banco Central. O grupo de trabalho formado pelo BC, Secretaria de Direito Econômico (MJ) e Secretaria de Acompanhamento Econômico (MF) chegou à conclusão de que o estímulo à concorrência e à maior transparência do setor pode ser obtido apenas mediante regras claras, expressas em lei, e complementadas por medidas de autorregulação que o setor se comprometeu a adotar.

¿Não se cogita criar uma legislação para que o Banco Central regule o setor, o que teria que ser feito por lei complementar¿, disse uma fonte que participou da elaboração do trabalho. Segundo essa fonte, um dos problemas mais sérios do setor está com os dias contados. Trata-se da exclusividade dos terminais que capturam as transações nas lojas. Na Redecard, essa exclusividade já caiu, o que significa que os terminais à disposição dos lojistas podem passar cartões de várias bandeiras. Já a exclusividade da Visanet só termina no ano que vem.

¿Até o meio do ano que vem, essa questão está resolvida¿, disse um técnico da área econômica. Quem participou do levantamento sobre o setor, e que resultou no diagnóstico da indústria de cartões no Brasil, está convencido de que o governo jogou duro com as empresas, apontando as principais falhas e entraves à concorrência que, no fim, prejudicam lojistas e consumidores. ¿Eles sentiram que a análise era para valer e que medidas duras poderiam ser adotadas. Então, decidiram colaborar¿, avaliou uma outra fonte.

Na autorregulação que será adotada, estarão preservados os princípios que garantem o ingresso de outras empresas e também o fim da verticalização, o que significa que vai deixar de estar a cargo de uma única empresa todo o processo.

Reclamações A decisão do governo certamente não agradará aos consumidores. Nas audiências públicas realizadas na Câmara dos Deputados, sempre foi cobrado que o setor estivesse subordinado a algum órgão. A preferência é pelo BC, que conseguiu, no passado, ordenar o segmento de consórcios. Os cartões de crédito estão entre os campeões de reclamações. No Procon-DF, o número de queixas sobre os cartões passou de 757 no período de março a setembro de 2008 para 1.024 em igual período deste ano.

O diagnóstico sobre o setor mostra que, em cinco anos, o volume de transações com cartões de crédito e débito passou de 1,4 bilhão, em 2002, para 3,9 bilhões, em 2007. As duas maiores bandeiras, Visa e Mastercard, respondiam, em 2007, por mais de 90% das operações. A taxa média de desconto, valor pago pelos lojistas aos credenciadores, era de 2,9%, chegando a 5% para o cartão de crédito, fora o aluguel das máquinas.

Veículos têm crédito recorde

Nunca os bancos emprestaram tanto e com taxas de juros tão baixas para os consumidores comprarem veículos. Estimulado pela redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI ¿ leia mais na página 14) , garantia de retorno do financiamento e forte queda da taxa Selic verificada este ano, o crédito disponível para aquisição de veículos bateu o recorde histórico da série do Banco Central. São R$ 85,285 bilhões acumulados até o mês de agosto. As taxas de juros para esse tipo de financiamento, de 26,2% ao ano, são as mais baixas já registradas no acompanhamento feito pelo BC desde julho de 1994.

O juro cobrado na compra a prazo de veículos ficou mais baixo até que o do crédito consignado, cujo volume de operações voltou a crescer em ritmo acelerado, acumulando, em 12 meses, 30,9%. Entre setembro de 2008 e agosto deste ano, o volume de crédito com desconto em folha passou de R$ 76,117 bilhões para R$ 97,977 bilhões. Os juros do crédito consignado em agosto estavam em 27,6% ao ano.

Consignado O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, disse que o crédito consignado é o que mais cresce, principalmente entre os servidores públicos. Como é uma modalidade de financiamento mais barata, Lopes acredita que o crescimento desse tipo de financiamento vai contribuir para a queda da inadimplência, que está estacionada em 5,9% ¿ percentual mais elevado da série. ¿Tendo à disposição crédito mais barato, as famílias passam a ter mais condições de honrar seus compromissos¿, observou.

O volume de crédito total que os bancos estão colocando à disposição dos clientes cresceu pelo sexto mês consecutivo e bateu, em agosto, em R$ 1,326 trilhão, o equivalente a 45,2% do Produto Interno Bruto do país (PIB). Essa é também a mais alta relação crédito/PIB da história. No geral, os juros atingiram 35,4% em agosto, patamar mais baixo desde dezembro de 2007. (vc)