Título: PT e PSDB travam batalha pela privatização
Autor: Lima, Maria; Fariello, Danilo
Fonte: O Globo, 17/08/2012, Economia, p. 27

Apoio de tucanos ao pacote é criticado por petistas, que acusam oposição de tirar proveito eleitoral

Maria Lima, Danilo Fariello e Fabiana Ribeiro

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BRASÍLIA e RIO O novo pacote lançado pelo governo para ampliar os investimentos em infraestrutura no país virou alvo de disputa verbal e ideológica entre líderes do PT e do PSDB. Os tucanos, que parabenizaram a presidente Dilma Rousseff pelo pacote, entendem que ela mudou e tom e estaria privatizando, adotando o receituário recomendado pelo PSDB para reduzir o tamanho do Estado e aumentar a capacidade de investimento. Os petistas reagem e rejeitam o rótulo.

A própria presidente, em seu discurso na quarta-feira, fez questão de dizer que não estava vendendo patrimônio público para fazer caixa ou abater dívida, tentando evitar comparações com o que aconteceu durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Em anúncio de quase meia página nos maiores jornais do país, a direção do PSDB publicou, em tom irônico, uma moção de apoio ao pacote de "privatizações" da presidente Dilma Rousseff.

Em nota publicada em seu site pessoal, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, bate na mesma tecla de Dilma e diz que a presidente não está se desfazendo de patrimônio público para acumular caixa ou reduzir dívida. Segundo o petista, estão sendo feitas parcerias com empresários para ampliar a infraestrutura do país, gerar empregos e fortalecer a economia nacional.

No pano de fundo, a eleição

Petistas ouvidos pelo GLOBO disseram que toda essa discussão não passa de uma estratégia eleitoral da oposição.

Na nota, Falcão diz que o Programa de Investimentos em Logística é um plano ambicioso, um programa complementar ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e uma continuação da política implementada durante o governo Lula, baseada no tripé crescimento, estabilidade e inclusão social.

O presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), não esconde que há um clima de euforia na oposição com o pacotaço anunciado por Dilma na quarta-feira. Ele disse que a estratégia da publicação da moção de apoio a Dilma foi negociada com o ex-presidente Fernando Henrique, o governador de São Paulo Geraldo Alckmin e outros líderes tucanos.

O PSDB quer marcar posição nesse embate político, para evitar novos ataques em períodos eleitorais à política de privatização do governo tucano.

- Achamos que foi uma mudança de rumos relevante e decidimos dar apoio à adoção de uma política de privatização que deu certo no governo Fernando Henrique e sempre criticaram. Os petistas não conseguem reconhecer que estão adotando uma política que deu certo no nosso governo. Mas agora caiu a ficha e deve estar sendo muito duro para eles engolir isso. Se usarem de novo as privatizações como arma de campanha será uma fraude. Isso nos prejudicou muito no passado - disse Guerra.

- Não vamos passar recibo de que a presidente Dilma está mudando o rumo da política de Lula e adotando o modelo de privatização de FH - reagiu o líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (PT-BA).

O senador Jorge Viana (PT-AC) também defendeu Dilma:

- Lula em seu governo fez o primeiro PAC e cuidou da área de inclusão social. A segunda etapa agora está sendo completada por Dilma, que está investindo pesado na área de infraestrutura, um dos grandes problemas do Brasil. Essa ironia que o PSDB está usando para tratar do assunto vai ficar no rodapé da História - disse ele.

A polêmica privatização de serviços

A despeito das manifestações políticas diversas, juristas ouvidos pelo GLOBO esclarecem que, segundo o Direito Clássico e as leis brasileiras, o pacote de rodovias será concedido e as ferrovias serão alvo de Parcerias Público-Privadas (PPPs).

Quando há privatização, o bem ou serviço é transferido para a iniciativa privada de maneira definitiva, explica Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC de São Paulo. Foi o caso da venda da Vale e da Usiminas. Apesar disso, a transferência dos serviços de telecomunicações à iniciativa privada em 1998 foi batizada de privatização do Sistema Telebrás.

Mas, seja por concessão ou privatização, governos vêm transferindo à iniciativa privada a empreitada de acelerar os programas de investimento. No caso das rodovias, os modelos podem ser dois: de pagamento de outorgas, como foi feito nos anos de Fernando Henrique, ou por meio de leilão pela menor tarifa, como foi o caso das concessões em 2008 pelo presidente Lula. No entanto, a questão é que muitas vezes o vencedor oferece uma tarifa muito baixa e depois acaba não conseguindo fazer investimentos e atrasa a entrega das obras ou negocia aditivos ao contrato.

- Ao contrário da concessão, a privatização não pode atingir os serviços públicos previstos pela Constituição, onde se incluem os sistemas de rodovia e ferrovia - disse Eduardo Carvalhaes, advogado do grupo de infraestrutura do Barbosa, Müssnich & Aragão, acrescentando que se o concessionário descumprir regras do contrato firmado, o governo pode até retomar o serviço. - Além disso, na concessão, é preciso haver investimento privado. Tanto que há um cronograma de investimentos, que não podem ocorrer apenas no início da concessão.

A malha ferroviária brasileira cresceu nos últimos anos, a partir de concessões federais ao setor privado. Os contratos para exploração do serviço de transporte de cargas por trilhos foram firmados pela governo entre 1996 e 1998. Dessa maneira, a malha ferroviária continua sendo do Estado, tendo um contrato por tempo determinado que garante ao concessionário a gestão do bem.

Nas PPPs, há subsídio do Estado

No caso das concessões ou nas PPPs, a transferência é temporária, como ocorre costumeiramente com as rodovias, explica Rosane Menezes Lohbauer, do escritório Madrona Hong Mazzuco Brandão.

As PPPs se diferenciam das concessões porque nelas há previsão de subsídio do Estado, uma vez que se trata de serviços cujas receitas individualmente não atrairiam a iniciativa privada, como na área de saneamento básico, por exemplo.