Título: Redução de danos para a plateia ver, diz promotor
Autor: Tardáguila, Cristina; Araújo, Vera
Fonte: O Globo, 19/08/2012, O País, p. 29

Metodologia do programa e abrigos carioca são criticados

A metodologia adotada pelo programa federal "Crack, é possível vencer", conhecida como política de redução de danos, é mais um alvo de críticas. Não por não ser adequada, mas por não estar sendo implantada como era esperado.

Médicos, pesquisadores e promotores que atuam na área afirmam que o que se vê no trabalho de campo é bem diferente do que se faz em outros países que seguem essa mesma filosofia de combate às drogas - já reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Enquanto na Holanda o governo distribui seringas a viciados em heroína para diminuir o compartilhamento de agulhas e, consequentemente, a incidência de hepatite e aids, por exemplo, no Brasil faz-se a remoção contínua dos dependentes que padecem nas ruas. Um exemplo de que discurso e prática vêm se distanciando.

- Aqui, é contra a lei o Estado fornecer drogas. E não temos substâncias que substituem o crack. Então nossa redução de danos é para a plateia ver - diz Marcos Kac, promotor que coordena a seção de Justiça Terapêutica do Ministério Público Estadual do Rio.

- O Brasil está investindo muito dinheiro num negócio que comprovadamente não dá certo. A remoção continuada de viciados das ruas não funciona sozinha e tratar apenas quem se apresenta voluntariamente é pouco - diz Florencia Balestra, pesquisadora do Instituto Igarapé. - Se a taxa de recuperação dos viciados que querem se tratar é baixa, imagina daqueles que são obrigados.

Desde 31 de março de 2011, a Secretaria Municipal de Assistência Social do Rio fez 94 ações em cracolândias cariocas. Nelas, foram registrados 4.706 acolhimentos. O GLOBO pediu aos envolvidos no programa federal dados oficiais sobre a reincidência de dependentes. Nenhum forneceu.

Na sexta-feira, um grupo compostos por profissionais dos conselhos regionais de Psicologia e Serviço Social do Rio, da PUC-Rio, do grupo Tortura Nunca Mais, da ONG Projeto Legal e da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) também apontaram problemas nos locais de tratamentos que funcionam na cidade. Num relatório feito com base numa visita realizada a quatro abrigos mantidos pela Casa Espírita Tesloo, que fica na Zona Oeste e é conveniada da prefeitura, o grupo aponta uma lista de deficiências. Entre elas, a "medicalização diária e generalizada". Segundo o relatório, os dependentes dos quatro abrigos tomam por padrão quatro remédios diferentes todos os dias, além de injeções de Haldol e Fenergan (os chamados "Sossega Leão").

- Haldol é um sedativo que diminui a atividade psíquica anormal como alucinações e delírios - diz o psiquiatra Jairo Werner. - Fenergan é um antialérgico que evita os efeitos colaterais do Haldol. O uso contínuo deles pode gerar sequelas como tremores.

Procurados pela reportagem, os administradores da Tesloo não retornaram.