Título: Crescimento sustentável depende agora de investimentos
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Fonte: O Globo, 21/08/2012, Opinião, p. 18

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, mostrou-se entusiasmado com os resultados do índice usado pelo Banco Central para avaliar a temperatura da economia. Em junho, após muitos meses de declínio, esse índice apresentou razoável recuperação. Devido aos fatores considerados, o índice do BC é tido como uma prévia do comportamento do Produto Interno Bruto (PIB), cujos dados são divulgados com mais desfasagem pelo IBGE. No seu entusiasmo, o ministro Mantega chegou a dizer que a economia havia dobrado o "Cabo da Boa Esperança", em uma alusão ao difícil trecho que os antigos navegadores enfrentavam no caminho marítimo para as Índias. Antes chamado de Cabo das Tormentas, depois de vencido pelos navegadores foi rebatizado como Boa Esperança, pois a partir daquele ponto a viagem se tornava menos ameaçadora.

De fato. outros indicadores apontam para uma ligeira recuperação da economia. O índice do IBGE que acompanha o desempenho do comércio voltou a registrar crescimento em junho. Do mesmo modo, a geração de empregos formais foi bastante positiva em julho, inclusive na indústria de transformação. No próprio mercado financeiro, acredita-se que a economia brasileira chegará ao fim deste ano com um ritmo de expansão de 4% (projetado para doze meses), mantendo-se nesse patamar ao longo de 2013.

É bem provável que o desempenho da economia brasileira no ano que vem seja mais positivo que o de 2012, entre outras razões pela aceleração de investimentos voltados para a realização da Copa do Mundo em 2014 e das Olimpíadas de 2016.

No entanto, não se trata de um destino inexorável. O ambiente internacional continua confuso, sem que haja perspectiva de solução de curto prazo na crise que abala várias economias da Europa. A Ásia, que vinha desempenhando o papel de locomotiva do mundo, perdeu um pouco do seu fôlego, o que tem-se refletido, por exemplo, nos preços do minério de ferro, hoje o principal produto brasileiro de exportação.

A economia brasileira estaria sendo impulsionada, no momento, por estímulos temporários ao consumo, e sabe-se que os efeitos disso podem desaparecer rapidamente. O que a economia mais necessita agora é de investimentos sustentáveis (e, neste sentido, o programa de concessões de rodovias e ferrovias recém-anunciado pelo governo foi muito bem-vindo) para aumentar sua competitividade e dar condições para que o sistema produtivo reocupe espaços perdidos. Sem esse foco, corremos o risco de ter passado pelo Cabo da Boa Esperança, mas não no sentido de ida, e sim no de volta, chegando a uma área em que os antigos navegadores muitas vezes enfrentavam longas calmarias sem sair do lugar.