Título: Marco Aurélio e o revisor reagem à antecipação do voto de Peluso
Autor: Carvalho, Jailton de; Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 23/08/2012, O País, p. 4

"Sobre isso, ainda não conversei nem com minha mulher", diz ministro

UM JULGAMENTO PARA A HISTÓRIA

BRASÍLIA Os ministros Marco Aurélio Mello e Ricardo Lewandowski, do Supremo, reagiram ontem contra a intenção do colega Cezar Peluso de antecipar na íntegra o voto dele sobre os 37 réus do processo no mensalão. Os dois entendem que Peluso só poderia votar sobre os trechos abordados pelo relator, Joaquim Barbosa, e pelo próprio revisor nesta primeira rodada de votação, sem avançar sobre acusações não analisadas pelos dois. Peluso gostaria de antecipar o voto desde que a proposta tivesse boa acolhida no tribunal. Nos bastidores, pelo menos quatro ministros apoiam o direito de Peluso votar como quiser. Entre eles, Barbosa e o presidente da Corte, Ayres Britto.

Ontem à noite, o próprio Ayres Britto falou sobre o assunto, negando que Peluso tivesse já tomado uma decisão sobre o que vai fazer:

- Não conversei com o ministro Peluso sobre isso e acho que ele não conversou com ninguém. Aliás, alguém tentou dizer isso... Não foi um ministro, não. Acho que foi a assessoria de imprensa: "Olha ministro, estão dizendo isso e isso". E ele (Peluso) respondeu: "Sobre isso não conversei nem com minha mulher".

assessoria do stf divulgou outra versão

Pouco antes da declaração de Ayres Britto, a assessoria de imprensa do STF dera outra versão para a frase de Peluso. Segundo assessoria, Peluso teria dito que a possível antecipação do voto seria "tudo mentira". Depois de consultar o ministro sobre o conteúdo da frase, a assessoria de imprensa divulgou uma outra versão, dizendo que ele apenas falara não ter comentando com ninguém sobre o que pretende fazer.

Um dos ministros que apoiam o voto integral de Peluso disse ao GLOBO que o assunto deve ser levado ao plenário tão logo termine a exposição do voto do revisor, o que pode acontecer hoje ou na próxima segunda-feira. O voto de Peluso tem sido um dos pontos de tensão entre defesa e acusação desde o início do julgamento.

Por lei, Peluso tem que se aposentar até 3 de setembro, quando completa 70 anos de idade. A ideia do ministro é antecipar o voto na íntegra, logo depois da exposição do revisor. Mas o ministro não gostaria de alimentar conflitos internos. O debate, porém, já está na ordem do dia.

Antes mesmo de a proposta ser apresentada formalmente, Marco Aurélio e Lewandowski se posicionaram contra. Sem citar o nome de Peluso, Lewandowski iniciou ontem seu voto com o recado velado ao colega, dizendo que ele, revisor, não ultrapassaria os limites que teriam sido fixados pelo presidente da corte.

- Se assim o fizesse, estaria ultrapassando o relator e ferindo o artigo 135 do regimento interno - disse o revisor.

Segundo Marco Aurélio, não há registro no tribunal de antecipação de voto à exposição de relator e revisor. Ao ser lembrado de que não há nada que proíba, o ministro respondeu:

- Mas, veja, não há nada que diga que integrantes não podem votar antes do relator, porque é impensável. O colegiado é democrático, e a maioria que decide - disse Marco Aurélio.

O artigo 135 do regimento interno do Supremo Tribunal Federal prevê que "os ministros poderão antecipar o voto se o presidente autorizar". O texto nada diz, no entanto, sobre a antecipação ao voto do revisor e do relator. Sem a proibição expressa, Ayres Britto poderia por conta própria permitir ou não.