Título: Sem incentivo à oferta, país não pode crescer
Autor: Rodrigues, Lino; Sorima, João
Fonte: O Globo, 01/09/2012, Economia, p. 28

Para economista da PUC, indústria pouco competitiva põe economia numa situação delicada

José Márcio Camargo, economista da Opus Gestão de Recursos (e da PUC-RJ), diz que o governo já está acordando para a necessidade de estimular os investimentos, com o pacote de infraestrutura e as desonerações fiscais. A expectativa de Camargo para o crescimento da economia em 2012 é pouco animadora: de 1,6%.

A que se pode atribuir o baixo desempenho da indústria, que teve impacto no PIB?

Existe uma enorme capacidade ociosa no mundo. As importações cresceram bastante no trimestre (1,8%) e, ao mesmo tempo, a indústria brasileira continua muito pouco competitiva, porque está extremamente caro produzir no Brasil: a infraestrutura está muito deteriorada, os salários estão relativamente altos, a produtividade é baixa. Estradas, telecomunicações, está tudo seriamente deteriorado. Como o setor industrial produz bens comerciáveis, a indústria tem dificuldades de competir com as importações, o que está fazendo com que a demanda seja atendida com o aumento de importação e não da produção interna. O consumo continua em alta, embora esteja desacelerando. O grande problema não é falta de consumo, e sim o fato de estar sendo suprido pelas importações.

Apesar disso, o governo continua apostando em medidas de incentivo ao consumo, como a redução do IPI para alguns setores. É uma medida acertada?

Uma parte das medidas do governo é voltada para o consumo, mas o governo já começa a se preocupar com essa parte da oferta, ao fato de que está caro produzir no Brasil. As medidas de desoneração tributárias são parte desse processo. Está se falando agora da redução do custo de energia e o pacote de concessões de rodovias e ferrovias são medidas que visam à oferta, o que, para mim, é efetivamente o que está travando o crescimento do PIB de forma mais robusta. O governo começou a tomar medidas de incentivo ao consumo, mas está começando a parceber que, sem o devido incentivo à oferta, vai ser difícil crescer.

E qual seria o caminho em direção a um crescimento mais significativo?

Ter uma infraestrutura de qualidade, e o setor público não consegue fazer isso. É fundamental ter aeroportos de qualidade e que seja barato ir e vir; o sistema de telecomunicações está atravancado pelo excesso de demanda. Outro ponto importante é que a legislação trabalhista incentiva o trabalho de curto prazo e não o treinamento e a qualificação no local de trabalho. E a questão tributária é caótica. São medidas importantes, mas que vão sendo proteladas, porque são politicamente difíceis. Essa combinação de excesso de capacidade produtiva no mundo e um setor industrial pouco competitivo coloca a economia numa situação delicada.