Título: A Dilma é a menina de ouro do Lula
Autor:
Fonte: O Globo, 01/09/2012, O País, p. 10

Petista diz que, como a presidente, conseguirá luz própria; sobre mensalão, acha inverossímil

Fernanda da Escóssia, Germano Oliveira, Gilberto Scofield,Marcelle Ribeiro, Sérgio Roxo e Tatiana Farah

SÃO PAULO Aos 49 anos, o ex-ministro da Educação disputará a primeira eleição e comemora a subida nas pesquisas. Perguntado sobre o peso de ser "o menino de ouro" do ex-presidente Lula, cita o exemplo da presidente Dilma, a quem chamou de "menina de ouro", e afirma que, em uma eventual derrota, a responsabilidade será sua e não de seu padrinho político.

Dia bom para o senhor (empate técnico com José Serra, pelo Ibope), mas ruim para seu partido. Dois candidatos foram afastados por suspeita de corrupção. O que tem a dizer para a população, como um candidato petista?

O Brasil está vivendo uma fase importante de não deixar mais as coisas passarem. E de enfrentar os problemas institucionalmente. Veja o julgamento no STF da ação penal 470: oito dos onze ministros foram indicados pelo presidente Lula. O procurador-geral que fez a denúncia foi indicado e reconduzido pelo presidente Lula, assim como o atual. Todos os órgãos que investigaram foram indicados, Polícia Federal, ministro da Justiça. Compare isso com os anos 90. Nenhuma denúncia apurada. Nada, nada, nada. Nem sobre compra de votos para a reeleição, nem sobre os escândalos das privatizações. Nem mesmo o escândalo envolvendo o PSDB de Minas, que é anterior e tem a mesma raiz desse caso que está sendo julgado.

Acredita que o PT tenha de rever seus procedimentos?

Todos os partidos estão revendo, né? O DEM não tem de rever os seus procedimentos internos?

Mas o senhor é do PT.

Estou respondendo como cidadão. O cidadão tem todo o direito de exigir que as instituições funcionem e que qualquer desvio de conduta seja exemplarmente punido.

Os envolvidos nesse caso têm de ser punidos?

Em todos os casos. O que não posso desejar é que haja seleção. Aquele ditado não pode valer: "aos amigos, tudo; aos inimigos, a lei".

O senhor se apresenta como o novo, mas procurou aliados antigos, como o deputado Paulo Maluf. Foi um erro se aliar a ele? O senhor foi à casa dele...

Não opero fulanizando o debate sobre coligação. Todos os partidos, o meu, os demais e os da oposição, têm contas a prestar a respeito de pessoas que possam estar sob suspeita, sendo investigadas, processadas.

Como se constrói maioria na Câmara em São Paulo sem o toma-lá-da-cá dos partidos?

Já conhecendo a realidade de São Paulo, quis usar a eleição para legitimar um plano. Se eu apresentar o que eu vou fazer, vai ficar mais fácil o diálogo. Dois: você tem que utilizar os instrumentos modernos de administração pública. Eu pretendo criar um Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social na cidade. Estamos discutindo um plano de descentralização, de desassociar esse ímã perverso que atrai tudo para cinco subprefeituras.

Na prática, isso quer dizer o quê?

Preciso criar estímulos fiscais e econômicos para descentralizar as atividades econômicas. Para isso, preciso de um desenho urbano, fazer o que Prestes Maia fez nos anos 30, invertendo o sinal. Tenho que distribuir as atividades econômicas. Todo o nosso plano de investimento, contando o investimento social, está orçado em R$ 20 bilhões.

E vai conseguir as parcerias com o governo estadual?

Estadual e sobretudo federal. Posso dizer uma coisa? Nunca tive dificuldade de parceria com o governador (Geraldo) Alckmin. Não tinha picuinha.

Grande parte da rejeição a Serra se deve a ele ter deixado a prefeitura de São Paulo para disputar o governo. Se eleito, vai cumprir seu mandato?

Com muita satisfação. Fiquei oito anos no Ministério da Educação. Não gosto de deixar nada no meio. Concluí um ciclo no Ministério antes de mais nada. Eu fui sondado para ser candidato a governador em 2010 e não aceitei.

Pelo presidente Lula?

Sim. Eu falei: preciso concluir algumas coisas importantes no MEC. Então eu não tenho esse olhar.

O mensalão foi uma lição de como não se deve construir uma base?

Eu não penso que ele se prestou a isso, sinceramente, à luz do que eu ouvi.

O senhor acha que o mensalão existiu ou não?

O Supremo Tribunal Federal está dando a última palavra sobre isso.

O Supremo diz que existiu...

É, mas ele não está dizendo que o propósito foi para a constituição de maioria, isso eu não percebi da decisão. E, conhecendo o tamanho do Congresso, acho muito inverossímil que tenha sido para isso. Mas, enfim, vamos aguardar o final do julgamento. Não tenho base técnica.

O ex-ministro José Dirceu participa da campanha?

Eu encontro o Zé Dirceu em ambientes sociais. A última vez foi com Serra, no aniversário do (presidente do PCdoB) Renato Rabelo. E dei uma entrevista para o blog dele, a seu pedido, há alguns meses.

O senhor foi secretário da então prefeita Marta Suplicy quando a taxa do lixo foi aprovada, mas disse que não fez parte da decisão.

Não disse isso. Disse que houve decisão política à luz da situação financeira. Eu era chefe de gabinete de Finanças. Vamos colocar peso nas coisas. Daqui a pouco, o pobrezinho que está ocupando meu cargo ali vai ser acusado do descalabro da gestão Kassab. A prefeita se viu diante de uma situação de descalabro financeiro. Hoje o orçamento da prefeitura é três vezes maior.

Hoje não precisa de taxa?

Ao contrário, fizeram um choque tributário. O que não dá para entender é como, com tanto aumento de arrecadação que houve com o choque tributário que eles deram... Porque uma parte foi crescimento econômico, do governo Lula. Mas a outra parte foi choque tributário na veia. Como é que, nessas circunstâncias, criam a taxa do carro (para inspeção veicular)?

Por que Marta Suplicy demorou tanto para entrar na campanha?

Tem uma questão pessoal envolvida, que temos que respeitar. As pessoas têm o tempo de amadurecer, têm sua sensibilidade. As pessoas não são máquinas políticas.

O senhor se sente desconfortável com a posição de ser o "menino de ouro" do ex-presidente Lula?

Mas a Dilma também é a "menina de ouro" do presidente Lula.

O senhor acredita que vai dar esse salto que a presidente deu e se descolar dessa imagem?

Você vai ganhando mais ou menos peso à luz do trabalho que você faz. O presidente Lula não me conhecia quando me nomeou ministro da Educação. Eu era para ele o que eu continuo sendo, um professor de universidade, que decidiu servir a um projeto político com o conhecimento que acumulou, servir ao país sem projeto pessoal.

Pesa um pouco ser o candidato do presidente Lula? Se o senhor ganhar, é uma vitória dele. Se o senhor perder, será derrota dele...

Posso te assegurar que, se eu perder, vai ser minha (risos). A vitória tem muitos pais.

Que conselhos o presidente Lula deu para disputar a eleição?

Ele brinca muito. Falou: "Lê pouco jornal, que você ganha a eleição. Se não, você vai se aborrecer demais".

A última pesquisa Ibope mostra que o senhor começa a encostar no Serra. A estratégia de poupar Russomanno e bater em Serra deu certo?

Não estou batendo em ninguém. Estou fazendo uma crítica democrática a uma administração que considero que perdeu uma grande oportunidade. Tivemos uma década de ouro no Brasil. Muitos governantes souberam aproveitar as oportunidades e não fizemos isso aqui.

Uma de suas propostas é o Bilhete Único Mensal. Quanto vai custar aos cofres da prefeitura?

Não é caro, vai custar cerca de R$ 400 milhões (de subsídio). Em torno de R$ 140 (para o usuário).

Serra disse que não compensa e chamou de bilhete mensaleiro...

Ele comete um equívoco político grave. Ele imagina aquele mundo anterior em que só eles viajavam. Hoje muita gente viaja para o exterior e compra o bilhete mensal em Paris, em Londres. Não é correto para a população você desinformá-la.

O senhor acha que haverá mais críticas como a do "bilhete mensaleiro" até o final das eleições?

Eu estou pronto para debater o que quer que seja. Para mim debate é sempre bom. Cada um oferece o que tem para a sociedade. Vou oferecer o melhor que tenho em mim.

Durante os problemas no Enem, denúncias de vazamento, recebeu puxões de orelha da presidente?

Ao contrário, recebi solidariedade. Quando o Estado sofre um atentado, os governantes se solidarizam. Foi um crime de um delinquente que, felizmente, foi responsabilizado e punido com cinco anos de cadeia.