Título: Mais do mesmo em Angola
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Fonte: O Globo, 04/09/2012, Opinião, p. 16

José Eduardo dos Santos, o ZéDu, há 33 anos no poder em Angola, ganhou nas urnas mais cinco anos de mandato, com 72% dos votos. A opositora Unita dobrou sua votação para 18,6% e uma nova força de oposição, Casa-CE, teve 6%. A princípio, nada muda no país africano rico em petróleo e diamantes, apesar de o slogan da campanha do MPLA, de Santos, ser "Angola: mais crescimento, melhor distribuição."

O mote reconhece um dos problemas do país: a economia disparou com o fim da guerra civil (1975-2002) e a riqueza cresceu exponencialmente, mas só para alguns. Dos angolanos, 87% vivem em favelas e mais de um terço abaixo da linha de pobreza. Em 2011, o país ficou em 148º lugar entre 187 no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU e em 168º entre 183 no Índice de Percepção da Corrupção, da Transparência Internacional. Mas a família Santos e os quadros do MPLA, partido quase único, vão muitíssimo bem, obrigado.

Ainda assim, o governo tem muito a mostrar. Angola, segundo maior produtor de petróleo da África negra, tornou-se o principal fornecedor da China. Linhas de crédito chinesas criaram um boom na construção de casas, hospitais, escolas, estradas e pontes. Os críticos dizem que as obras, tocadas por 250 mil operários chineses, apesar de o desemprego oficial estar em 26%, são de baixíssima qualidade.

O desafio da reconstrução permanece. O país foi um dos campos de batalha da Guerra Fria por 27 anos, tendo de um lado o MPLA de ZéDu, apoiado pela antiga URSS e por soldados cubanos, contra a Unita de Jonas Savimbi, com o suporte dos EUA e da África do Sul do apartheid. Meio milhão de pessoas morreram na guerra e mais de 4 milhões, um terço da população de então, tornaram-se refugiados internos, e muita infraestrutura foi destruída.

Angola é de grande interesse para o Brasil, primeiro país a reconhecer o governo do MPLA em 1975, no governo Geisel, antes de qualquer nação africana, numa operação bem conduzida por um Itamaraty que conseguia influenciar o Planalto. Grandes empresas nacionais operam lá e a comunidade brasileira é estimada em 25 mil pessoas. Em 2011, só a Argentina recebeu mais empréstimos do BNDES que Angola. As relações se estreitaram durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva, que esteve três vezes no país, a última já como ex-presidente, em 2011. A presidente Dilma Rousseff visitou Angola no ano passado.

O arremedo de democracia em Angola poderá levar ZéDu a 38 anos no poder. Mas essas dinastias longevas trazem embutidas o germe da instabilidade. Vide a Primavera Árabe, ponto final de ditaduras de três décadas no Egito, na Líbia, na Tunísia. E pode levar outros países, como a Síria, à guerra civil. Angola já passou dolorosamente por isto e o único antídoto conhecido para evitar o derramamento de sangue é a democracia. Preocupa que Angola ainda tenha de esperar para alcançá-la.