Título: A medida do bem-estar
Autor: Verdini, Liana
Fonte: Correio Braziliense, 27/09/2009, Economia, p. 26

Evolução mensurada pelo cálculo tradicional do PIB não basta e notáveis propõem parâmetros baseados na qualidade de vida

A riqueza de um país deveria ser medida não apenas considerando os bens e serviços que produz, mas também o nível de bem-estar alcançado por seu povo. É o que propõe uma comissão de notáveis liderada pelos economistas Joseph Stiglitz e Amartya Sen, ambos ganhadores do Prêmio Nobel de Economia, e Jean Paul Fitoussi, do Institut d¿Etudes Politiques, a pedido do presidente da França, Nicholas Sarkozy. Além da produção, os indicadores deveriam capturar o comportamento e a distribuição da renda familiar, do consumo e da riqueza, considerar em quais atividades as pessoas trabalham e o que fazem fora da jornada e incluir informações sobre educação, saúde, meio ambiente, conexões sociais, aspectos políticos e insegurança em relação à economia e ao futuro da natureza.

A Comissão de Mensuração do Desempenho Econômico e da Evolução Social teve o desafio de identificar as limitações de um indicador como o PIB (Produto Interno Bruto, que é soma dos bens e serviços produzidos por um país em um determinado período de tempo), amplamente utilizado. O PIB consegue sinalizar a progressão ou a regressão da riqueza, mas não considera disparidades individuais e sociais. Os notáveis ¿ economistas e cientistas sociais de várias universidades e organismos europeus ¿ também deveriam propor indicadores para medir o progresso social dos países.

Atualmente, por exemplo, os Estados Unidos ocupam o quarto lugar no ranking do Banco Mundial relativo ao valor do PIB por habitante (PIB per capita) e a 15ª colocação no ranking de desenvolvimento humano (IDH), índice elaborado pela Organização das Nações Unidas. Um mede a produção; o outro pondera indicadores de renda, educação e longevidade. Em um exercício utilizando números de 2004, a comissão simulou o que aconteceria com os indicadores da Itália. Pelo tradicional ranking do PIB, a Itália ocupava a 18ª posição. Considerando o conjunto de aspectos econômicos, sociais e ambientais relacionados à qualidade de vida, ao bem-estar e ao trabalho doméstico, o país subiu para o 11º lugar.

Além da riqueza material

As estatísticas do PIB per capita podem não refletir de forma fiel a realidade da maior parte dos cidadãos. Esse é o argumento central do prêmio Nobel de Economia e professor da Columbia University na defesa das mudanças dos indicadores que aferem o grau de evolução das economias. Em artigo publicado no jornal italiano La Repubblica dois dias antes da entrega da proposta da Comissão de Mensuração do Desempenho Econômico e da Evolução Social ao presidente Sarkozy, Stiglitz disse que ¿um bom índice de medida para compreender como estamos procedendo deve levar em consideração a sustentabilidade. As contas da nossa nação devem refletir o exaurimento dos recursos naturais e a degradação do nosso meio ambiente¿.

O economista lembrou que entre 2000 e 2008, a renda média domiciliar americana retrocedeu cerca de 4%. No mesmo período, o PIB subiu. ¿O que medimos afeta o que fazemos. Se temos indicadores falhos, vamos focar em alvos errados¿, escreveu ele em artigo publicado no jornal inglês Financial Times em 13 de setembro. ¿Na busca por aumento do PIB, podemos acabar com uma sociedade em que os cidadãos ficaram em piores condições. Aliás, nos preocupamos não apenas pelas condições em que estamos hoje, mas também como estaremos no futuro. Se estamos nos endividando de maneira insustentável no futuro, gostaríamos de saber.¿

No documento entregue ao presidente francês Nicholas Sarkozy, os economistas lembram a gravidade da atual crise mundial. ¿A pior do período pós-guerra¿, classifica o texto. Para os notáveis, a turbulência econômica tornou urgente a reforma dos indicadores, pois tanto governos quanto profissionais do mercado estavam focados em indicadores imperfeitos. E se houvesse maior consciência das limitações dos indicadores, como o PIB, a euforia em relação ao desempenho econômico nos anos anteriores à crise teria sido menor. ¿Métricas que incorporassem indicadores de sustentabilidade, como o que apontava o crescente endividamento, poderia ter resultado em uma postura mais cautelosa da performance econômica¿, relata o documento.

Sugestões Por isso, a comissão propõe cinco medidas para lidar com as limitações do PIB. Primeiro, nas contas nacionais devem ser considerados outros indicadores, além do PIB. A melhora da mensuração da produção de atividades chave, como serviços de saúde e educação, é outra sugestão. Também é recomendado que se considere a perspectiva familiar, que traduz melhor o padrão de vida da sociedade. Outras sugestões são acrescentar informações sobre distribuição de renda, consumo e riqueza com a evolução média e ampliar o âmbito do que já vem sendo medido no PIB, considerando que uma parte significativa das atividades econômicas são informais e não entram nas estatísticas oficiais.

O trabalho também sugere o aprimoramento da forma de medir os serviços prestados pelo Estado, deixando de considerar somente o orçamento alocado, mas relacionando a produção alcançada com os recursos destinados ao serviço. Países como Austrália e Nova Zelândia desenvolveram mecanismos para avaliar os serviços chaves prestados pelo Estado. (LV)

Métricas que incorporassem indicadores de sustentabilidade, como o que apontava o crescente endividamento, poderia ter resultado em uma postura mais cautelosa da performance econômica¿

Trecho do relatório elaborado pela Comissão de Mensuração do Desempenho Econômico e da Evolução