Título: Comissão só investigará crimes do Estado
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 18/09/2012, País, p. 13

Em resolução, grupo oficializa que não vai apurar atos cometidos por militantes de esquerda

Em resolução unânime publicada no Diário Oficial de ontem, a Comissão da Verdade descartou a possibilidade de o grupo vir a investigar crimes cometidos por militantes de esquerda durante a ditadura. A resolução formaliza a decisão de que só serão apuradas e investigadas as violações de direitos humanos - como tortura, desaparecimento e mortes - praticadas pelos agentes de Estado.

Segundo o ex-procurador-geral da República Cláudio Fonteles, a criação da comissão encerra o ciclo iniciado com a promulgação da lei que criou a Comissão de Mortos e Desaparecidos e reconheceu a culpa do Estado por esses crimes. Para Fonteles, integrante da comissão, o Estado, por seus agentes públicos, cometeu violações.

"Foram graves violações de direitos humanos, que se constituíram em condutas de torturar, assassinar, fazer desaparecer quem quer que, por razões políticas, se opusesse ao sistema ditatorial", afirmou Fonteles, em nota divulgada pela assessoria da comissão.

Na avaliação do ex-procurador-geral da República fica claro, portanto, que a comissão "não tem atribuições legais para investigar condutas de pessoas, que não são agentes públicos ou a serviço do Estado". "Devemos, pois, todos respeitarmos os parâmetros legais. Esse é um dos fundamentos básicos da democracia", informa na nota.

decisões não serão revisadas

A comissão decidiu também que não irá revisar processos julgados tanto pela Comissão de Anistia como pela Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos. Assim, quem teve pedido de indenização negado não poderá recorrer à Comissão da Verdade para mudar o resultado. Do mesmo modo, o grupo não vai anular benefícios concedidos por outras instâncias.

Desde que foi criada, a comissão vem sendo cobrada por militares da reserva a também avaliar a conduta de militantes de esquerda acusados de realizar sequestros, assassinar soldados e até mesmo pessoas dos movimentos que eram identificadas como traidores, no chamados justiçamentos. Esses militares divulgam em sites na internet relações de nomes de opositores que atuaram nessas ações.

Ao negar a possibilidade de investigar esses crimes, o grupo atende a uma das dezenas de reivindicações dos grupos de direitos humanos, compostos por militantes, ex-perseguidos políticos e parentes de desaparecidos pela ditadura. A resolução segue o que já estava previsto na lei que criou o grupo delimitando as ações de investigação apenas entre os agentes de Estado.